“Fiz este filme para qualquer pessoa que já teve de esconder ou mudar parte de si para seguir os seus sonhos”, disse a realizadora Cristina Costantini, em entrevista à agência Lusa. “E penso que essa é, tristemente, uma experiência mais relevante que nunca em 2025”, continuou. “O filme é sobre várias formas de coragem”.

Sally Ride foi a primeira norte-americana numa missão da NASA, tendo voado no vaivém espacial Challenger a 18 de junho de 1983 com quatro astronautas masculinos.

A viagem pioneira foi um dos grandes acontecimentos mediáticos do ano, considerada inspiradora para raparigas que nunca se tinham visto representadas num ambiente com fasquia tão elevada. Cristina Costantini foi uma delas.

Cristina Costantini
Cristina Costantini Cristina Costantini créditos: Lusa

“Era uma grande fã da Sally desde criança”, explicou. “Tal como muitas jovens, vi nela uma equação simples: se uma mulher pode fazer algo tão grande e tão corajoso, talvez eu também possa concretizar algo incrível”.

Mas a ascensão de Sally Ride foi difícil e cheia de obstáculos, algo que o documentário explora mostrando como a astronauta teve de superar o machismo convencional da época.

“As mulheres eram tratadas como crianças, questionavam como iam lidar com aquilo, como iam evitar chorar”, salientou a realizadora. A NASA não estava pronta para acomodar mulheres. Em preparação para a ida de Sally, desenvolveu um 'kit' de maquilhagem no espaço que não era necessário e questionou se 100 tampões eram suficientes para 6 dias.

“Creio que muitas outras pessoas não teriam conseguido um desempenho tão bom sob pressão como a Sally conseguiu”.

Mas Sally Ride escondeu um segredo durante toda a sua vida, precisamente por temer que a mentalidade conservadora arruinasse a sua carreira. Este documentário explora esse lado em entrevistas a fundo com a sua parceira de 27 anos, Tam O’Shaughnessy.

“É importante que a história seja verdadeira e honesta, e a história de Sally não estava completa”, disse à Lusa. “Eu queria essa história contada”.

O mundo só soube da relação amorosa entre as duas em 2012, quando Sally Ride morreu de cancro aos 61 anos, e no seu obituário foi revelado que deixava uma parceira. Até aí, apenas a família e amigos mais próximos tinham conhecimento da homossexualidade da astronauta.

Quando o então presidente Barack Obama distinguiu Sally Ride com a Medalha Presidencial da Liberdade, entregou-a a Tam O’Shaughnessy. “Fiquei muito impressionada e senti-me honrada”, contou.

O casamento entre pessoas do mesmo sexo foi legalizado três anos depois e Tam considerou que o progresso feito era enorme, mas agora tem uma perspetiva menos otimista.

“Tanto no nosso país como noutras partes do mundo, há muita gente que não acredita em casamento entre pessoas do mesmo sexo, nos direitos LGBT, nos direitos dos imigrantes ou das mulheres”, lamentou. “É uma batalha humana permanente e temos de continuar a esforçar-nos pelos valores que são importantes e estão a ser desmantelados diariamente. É um momento horrível e assustador”.

Este contexto aumenta a relevância do documentário, algo que Cristina Costantini não previra quando começou a trabalhar com o National Geographic e a empresa de produção Story Syndicate.

“Não fazíamos ideia de que iria sair num momento em que a DEI [diversidade, equidade e inclusão] está sob ataque e que a NASA está a ser forçada a retirar bandeiras do Orgulho Gay”, afirmou. “É mais relevante que nunca”.

A realizadora tinha pensado em explorar a história depois de descobrir que Sally tinha uma parceira. “Pensei: 'Uau! Se a NASA mal estava preparada para mulheres, como é que terá sido amar uma mulher numa agência super heteronormativa, sexista e provavelmente homofóbica naquele tempo?'”

Quando abordou o National Geographic sobre o filme, soube que o canal já estava a trabalhar na história, para sua surpresa, e as peças do puzzle caíram no lugar.

“Leio as manchetes e pergunto-me o que aconteceu às pessoas corajosas. Precisamos de mais Sallys e Tams no mundo”, afirmou. “Precisamos que mais gente defenda a justiça, igualdade e verdade”, continuou. “Pessoalmente, estou a encontrar muita inspiração e esperança em Tam e Sally”.

O filme estreia-se no Disney+ a 17 de junho e no canal National Geographic a 21 de junho.