«As Asas do Vento» é o derradeiro épico do mestre da animação, Hayao Miyazaki, entretanto retirado da cadeira de realizador.
Trata-se de uma incrível obra que abre as asas da imaginação, num tributo a Tatsuo Hori, autor que viveu os acontecimentos retratados no filme (escreveu o romance homónimo que inspirou este registo), e a Jiro Horikoshi, um reputado engenheiro aeronáutico responsável pela criação do lendário e temível caça Zero durante a Segunda Guerra Mundial.
Tatsuo Hori e Jiro Horikoshi fundem-se para formar o protagonista Jiro. O espectador segue a sua vida, da infância até ser um homem de meia idade, marcada pela perseverança que carrega sonhos de mudança e enfrenta a adversidade em busca do salto tecnológico. Ironicamente, a sua miopia não turva uma visão de desafiar as fronteiras do conhecimento.
No decurso de 30 anos atravessamos os principais acontecimentos do Japão, do campo à cidade, da era feudal até ao fim do Império do Sol, passando por momentos como o grande sismo de Kanto em 1923, a depressão económica, a pobreza, o surto de tuberculose e o fascismo.
É extraordinário como esses momentos são observados na obra como marcos de pura inspiração e crítica subtil que andam entre a ternura, o humanismo e o lado onírico que filtram a crueldade. Se piscarmos os olhos, perdemos um poema animado.
No seio desta obra também está um belíssimo romance entre Jiro e Nahoko, que se conhecem num dia trágico e reencontram-se dez anos depois graças ao destino e à força do amor.
O sonho de infância de Jiro é partilhado no mundo onírico com outro visionário da aviação, o italiano Gianni Caproni. Com vários interlúdios, saímos do realismo e partimos para outro reino onde nosso herói é orientado e questiona a moralidade da conquista dos céus para a criação de máquinas de guerra que almejam a destruição. Esta é uma amizade que atravessa as dimensões existenciais e as adversidades para alcançar uma visão.
A animação do estúdio Ghibli retrata visões distintas de um Japão feudal onde as cores verdejantes e os céus azuis irrompem no ecrã, contrastando com as cidades e cores de um modernismo tipicamente asiático e o caos na metrópole.
Quando entramos no reino dos sonhos, um terreno com a incontornável assinatura de Miyazaki, tudo flui num abandono das leis da física e da gravidade com cores de rasgadas que convidam à imaginação.
Apesar do atraso da sua estreia nacional, «As Asas do Vento» é uma das grandes obras cinematográficas a estrear em 2015 em Portugal e visita obrigatória às salas de cinema. Esta é uma obra direcionada para um público maduro e um verdadeiro tratado de cinema e animação, bem como uma declaração contra a guerra.
Na flor do momento, «As Asas do Vento» é uma história de um rapaz e dos seus sonhos face ao engenho e capacidade destrutiva da humanidade, num trabalho assinado por um dos maiores realizadores do cinema moderno.
5 em 5
JORGE PINTO
REVISTA METROPOLIS
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