Há músicos de que é difícil lembrarmo-nos quando os ouvimos a primeira vez. Tom Waits é um deles, tão longa, variada e inesquecível é a sua carreira. Mas imaginemos que não era, que ele não tinha já quase 62 anos, que não lhe reconhecíamos a voz «ensopada em bourbon, fumada como um presunto e atropelada por um carro» (mais ou menos a maneira como o crítico Daniel Durchholz a descreveu uma vez). Imaginemos que «Bad As Me», o seu décimo sétimo álbum e primeiro de originais em sete anos, era o primeiro que lhe ouvíamos.
O que é realmente interessante é como descobrimos quase tudo o que há para descobrir sobre a música de Waits num só disco. Estamos na estrada (ou num comboio) nos Estados Unidos em «Chicaco» ou «Face to the Highway», melancólicos e contemporâneos em «Talking at the Same Time», agressivos e sonoros em «Get Lost», românticos em «Kiss Me» ou nostálgicos em «Last Leaf», para já não falar da faixa que dá título ao álbum. Li algures que talvez fosse um trocadilho com Bad Ass Me. Ou se calhar imaginei. Acontece-me, imaginar que estou a ouvir música de Tom Waits.
É claro que ao décimo sétimo álbum, Tom Waits tem uma aura semelhante a, digamos Woody Allen no cinema: toda a gente quer trabalhar com ele. Lembro-me de Mark Everett Smith (Mr. E dos Eels) dedicar alguns parágrafos da sua autobiografia «Things The Grandchildren Should Know» à colaboração com Waits, um dos momentos altos da sua vida. Em «Bad As Me» temos nomes como Marc Ribot e Keith Richards na guitarra e Flea no baixo, só para citar alguns.
Agora só me falta ouvir o Waits ao vivo. E nem me importo que a maior parte do concerto seja ocupada por este disco, por muito que goste muito de todos os outros. Quem quiser ouvir alguns dos clássicos é só dar um saltinho ao Music Box.
A verdade é que «Bad As Me» mostra um artista no seu auge, em pleno domínio de uma voz que vai do mais doce ao mais agreste, conduzindo os seus músicos em todas as paisagens da música americana, do rock ao blues ao jazz, com um lirismo, um sentido de humor, uma inteligência que lhe continuam a ser únicos.
E no fim, na última das três faixas extra da edição especial do disco, fica a pergunta… What is it like after you die?
Boa pergunta, mas parece-me melhor ideia voltar ao princípio do disco e ouvir de novo.
@Luís Soares
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