Uma publicação da Saída de Emergência acrescenta um novo capítulo à série de edições especiais que a editora tem posto no mercado – iniciando com Edgar Allan Poe, seguindo com H.P. Lovecraft e tendo como último lançamento as histórias de “Conan, o Bárbaro”: “Tarzan dos Macacos e outras Histórias da Selva” já se encontra à venda.
Tarzan dispensa maiores apresentações, mas para quem nunca se deparou com as dezenas de filmes e histórias publicadas a partir de 1912 por William Rice Burroughs, a narrativa acompanha os destinos de um bebé tornado órfão depois de um motim no navio que levava os seus pais à África. Acaba por ser recolhido por uma tribo de gorilas e cresce no meio deles. A partir daí, viverá aventuras diversas.
A carreira literária de Burroughs começa nas “pulps”, revistas muito baratas e com capas sensacionalistas vendidas nos quiosques americanos. Uma vertente crucial destas histórias, das quais um dos grandes legados seria a ficção científica, eram as assombradas trajetórias dos humanos em universos desconhecidos – entre os quais o fascinante mundo dos trópicos, das insondáveis selvas que podiam esconder animais pré-históricos, monstros gigantes ou simplesmente exigir, como aqui, um notável sentido de sobrevivência perante um exterior hostil.
Claro que, a momentos, a perspetiva de Burroughs põe em cena alguns conceitos hoje já invalidados, como o sentido etnocêntrico (e de superioridade cultural branca) que marcava muitas narrativas do século XIX e do início do século XX, onde a civilização ocidental enfrentava o seu “oposto” – o mundo primitivo da natureza, do mundo animal e de povos com cultura “atrasada”.
Diante da grande fé no progresso e na capacidade dos homens de solucionar os grandes problemas que o afligiam, típicas do século XIX e até as guerras mundiais do século XX abalarem essas convicções, não era muito espantoso que assim fosse.
Num momento do livro, por exemplo, o pai de Tarzan, Lord Greystoke, ao ver-se encurralado na selva onde o barco amotinado os deixou, diz: “Há centenas e centenas de anos, os nossos antepassados (...) defrontaram-se com os mesmos problemas... Hoje em dia somos a prova de que eles triunfaram. O que eles fizeram não seremos nós capazes de o fazer? (...) Não estamos armados com séculos de conhecimento superior (...) e que a ciência nos deu e que eles ignoravam por completo?”
Curiosamente, o protagonista acabará por voltar as costas, no futuro, aos espaços construídos por essa mesma civilização. Enquanto isso, a diversão está garantida em meio às florestas saídas da febril imaginação de Burroughs (que nunca visitou a África – o que, para feitos de ficção, pode ser mais um ganho do que um lapso), com o herói enfrentando inúmeros perigos e fazendo descobertas que o permitem aos poucos reconstruir o seu passado biológico – sempre em meio interessante debate entre civilização e “primitivismo”.
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