A série - que chegou a ter estreia marcada para junho, quando passavam dez anos da morte de José Saramago – teve uma antestreia em setembro no IndieLisboa, e começará a ir para o ar, na RTP 1, no dia 16 de novembro (segunda-feira), às 22h30, disse à agência Lusa o jornalista Carlos Vaz Marques.
Esta série televisiva é um projeto de Carlos Vaz Marques e Graça Castanheira, composto por 11 episódios que acompanham 11 autores de língua portuguesa distinguidos com o Prémio José Saramago, que revelam as suas memórias, vivências e atividades que conduzem ao processo criativo.
A cadência será semanal e a cada segunda-feira, no horário que foi até recentemente o do programa Prós e Contras, serão emitidos dois filmes, de aproximadamente meia hora cada, explicou.
A ordem pela qual os episódios serão transmitidos respeita a cronologia da atribuição do prémio, ou seja, na estreia irão para o ar os episódios que têm como protagonistas Paulo José Miranda e José Luís Peixoto, seguindo-se, na segunda semana, Adriana Lisboa e Gonçalo M. Tavares, e, a fechar o mês de novembro, Valter Hugo Mãe e João Tordo.
Já em dezembro, será altura de mostrar os bastidores de Andréa del Fuego e Ondjaki, Bruno Vieira Amaral e Julián Fuks, e a terminar a série, no dia 21 de dezembro, será transmitido apenas um filme, aquele que é dedicado ao mais recente premiado, Afonso Reis Cabral.
Em janeiro deste ano, ainda com a série em fase de rodagem, Carlos Vaz Marques contou à agência Lusa que a série pretende mostrar facetas dos escritores que serão "uma revelação mesmo para quem lê há muito os livros que escrevem".
Paulo José Miranda, distinguido com aquele prémio literário, em 1999, com "Natureza morta", recorda no documentário que na adolescência escreveu letras para uma banda punk e que gastou o prémio monetário numa câmara de filmar para a namorada da altura, cineasta.
No filme, o escritor recorda ainda o tempo em que viveu na Turquia e no Brasil, como essas vivências se refletiram no que escreveu, e explica a presença do álcool e do chá nas rotinas de escrita.
O episódio dedicado a Ondjaki foi rodado em Luanda, cenário, personagem e fonte de histórias que fazem parte do universo ficcional do escritor, nomeadamente nos livros "Avó dezanove e o segredo do soviético" e "Os transparentes", que lhe valeu o Prémio José Saramago em 2013.
Ondjaki revisita memórias de infância, com uma visita a escola onde estudou, com um almoço com antigos colegas, e num jogo verbal de 'estiga' com três crianças.
Adriana Lisboa, Prémio José Saramago em 2003 com "Sinfonia em Branco", passeia pelo Rio de Janeiro, ao encontro de locais essenciais no processo criativo, como a biblioteca nacional, onde habitam livros que, para ela, são "seres vivos".
A autora aprofunda ainda a ligação entre a escrita e a música - canta e toca flauta transversal -, que lhe permitem oferecer ao leitor um certo "timbre de escrita".
João Tordo percorre locais da infância em Lisboa, como a casa onde viveu, no mesmo prédio de Alexandre O'Neill e Ary dos Santos, e relembra o bloqueio literário que teve de ultrapassar depois de ter recebido o Prémio José Saramago, em 2009 com o romance "Três Vidas".
O facto de Valter Hugo Mãe ser devoto de São Bento, mesmo não tendo qualquer tipo de credo religioso; a descoberta da vocação de contadora de histórias da mãe de José Luís Peixoto; o modo como a construção de uma biblioteca no bairro social onde nasceu foi determinante na vida de Bruno Vieira Amaral, são outros aspetos da vida dos escritores abordados nos filmes.
A ideia foi pô-los em cena “naquilo que há de mais comum e também no que há de incomum no quotidiano deles”, disse o autor da série.
“O ato da escrita, só por si, não oferece grande espetáculo, mas antes e depois dessa atividade temos homens e mulheres com uma vida que os conduz a escreverem como escrevem. É essa articulação entre o modo como vivem e o modo como escrevem que queremos captar”.
Cada escritor é o narrador exclusivo do seu próprio filme: “Vemo-lo e ouvimo-lo seja contando-se a si próprio, sobre o seu percurso e a sua obra, seja interagindo com gente com quem se cruza no quotidiano, familiares e amigos”.
“Também não são filmes didáticos, no sentido de dizerem que fulano nasceu aqui ou ali, que editou não sei quantos livros, que está editado no estrangeiro e quais os prémios literários que recebeu. Tudo o que for possível encontrar na Wikipédia não estará com certeza nestes filmes”, afirmou.
Este projeto nasceu da constatação de que, em Portugal, faltam registos documentais cuidados, cinematográficos, daquilo que são os tempos atuais.
“A escassez de imagens dos nossos arquivos audiovisuais que documentem a vida e o pensamento de grandes nomes da cultura portuguesa é confrangedora”, notou, afirmando ter sido esse o motivo que o lançou neste projeto, para o qual pesou o facto de ser jornalista e de estar há muito ligado ao mundo dos livros, tornando-se-lhe evidente a falta de documentos audiovisuais no âmbito literário.
O gancho para colmatar essa falha foi o Prémio José Saramago, criado pela Fundação Círculo de Leitores e atribuído um ano depois de José Saramago ter ganhado o Prémio Nobel da Literatura.
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