Um grupo de multimilionários reúne-se em plena crise internacional numa montanha. Este é o ponto de partida de "Mountainhead", novo filme da Max, que se estreia este domingo, 1 de junho, escrito, realizado e produzido por Jesse Armstrong, o criador de "Succession".

O SAPO Mag esteve à conversa com Cory Michael Smith, que veste a pele de Venis, e Ramy Youssef (Jeff), que protagonizam o filme ao lado de Steve Carell (Randall) e Jason Schwartzman (Souper - Hugo Van Yalk). O elenco secundário adicional conta com Hadley Robinson, Andy Daly, Ali Kinkade, Daniel Oreskes, David Thompson, Ami MacKenzie e Ava Kostia.

Com atores de peso e uma premissa que promete tensão, sátira e momentos desconfortavelmente cómicos, "Mountainhead" despertou desde cedo a curiosidade da dupla protagonista — mesmo antes de existir um guião completo. "Não havia um guião disponível quando fui contratado para este trabalho. Então, [quem me convenceu] foi o Jesse Armstrong. ‘Succession’ é uma das minhas séries favoritas de sempre", revela.

"Jesse é um argumentista incrível, tanto de histórias quanto de diálogos, e em termos de tom, ele consegue fazer-nos rir e fazer com que as pessoas pareçam desprezíveis, e depois faz-nos amá-las e sentir pena delas. Acho que ele é um mestre na sua arte, e trabalhar com ele foi um sonho. Então, quando li o guião, pensei: ‘Oh, isto vai ser desagradável. Isto é desagradável. Vamos lá’”, conta o ator em conversa com o SAPO Mag.

"Fiquei fascinado com o poder que o dinheiro dava a alguém"

Mountainhead
Mountainhead créditos: HBO

Ramy Youssef, criador da série "Ramy" (também da Max) que fez parte do elenco de projetos como "The Studio", "Pobres Criaturas" ou "Mr. Robot", concorda com o colega. "Jesse Armstrong. Ouvi Jesse Armstrong e chegou. Fiquei muito interessado porque sabia que ele iria encontrar uma forma de falar sobre isso sem nos fazer adorar bilionários ou algo do género. Sabia que ele iria aprofundar o assunto e abrir uma porta diferente para uma conversa que todos nós estamos a tentar ter. E isso foi muito emocionante de fazer com esta equipa. E depois ouvi dizer que o Steve, o Jason e o Cory estavam nisso. E fiquei muito entusiasmado”, frisa.

“O guião era muito rico. Tão rico, mais rico do que todos”, acrescenta Cory Michael Smith ("Saturday Night", "Gotham", "Carol"). “Fiquei fascinado com o poder que o dinheiro dava a alguém, com o comportamento desprezível que aparentemente era permitido por causa disso, tanto em público como em privado. E isso é simplesmente assustador. Como ator, foi delicioso interpretar esse papel”, confessa o ator.

Veja o trailer:

Para Ramy Youssef, foi uma sorte poder interpretar “algo diferente dos outros papéis que já tinha feito”. “Estou sempre à procura de oportunidades para explorar uma energia diferente. E quando li sobre esta personagem, pensei: ‘Ok, sim, ele é um idiota, com certeza. Mas ele também é muito conflituoso e perturbado, e não sabemos se ele realmente vai ouvir a sua consciência’. Gostei dessa luta interna”, destaca o ator.

Para se prepararem para "Mountainhead", os protagonistas contam que “tiveram muitas conversas inspiradas pela clareza do guião”. “Não tivemos nenhum consultor financeiro. Mas adoro que pensem que não sou bilionário. Conversei com a minha herança futura”, graceja Cory Michael Smith.

Mountainhead
Mountainhead créditos: HBO

“Quando te entregas a um guião e encontras lá a maioria das respostas, é do melhor que há. Para mim, grande parte não era interpretar como se ele fosse rico. Era interpretar a partir dessa ambição e dessa sede que acho que muitas pessoas ricas têm, que é não se importarem realmente com o facto de serem ricas o tempo todo. Obviamente, estas personagens exibem o seu património líquido. Mas, para mim, isso é quase uma insegurança, porque, na verdade, acho que nenhum dinheiro é suficiente para elas. E acho que são movidas por um vazio que nunca conseguirão preencher. Há uma falta mesmo na abundância, e foi nisso que me concentrei ao construir a personagem”, explica Ramy Youssef na conversa com os jornalistas.

Para Cory Michael Smith, existe “um tipo de confiança que se divide em duas categorias: riqueza e beleza”. “E fico realmente fascinado ao observar como essas coisas se manifestam na vida real. E, estando em Nova Iorque, vemos muito das duas coisas. Como alguém que cresceu sem muito dinheiro, sempre achei fascinante observar isso, viver nesta cidade e estar exposto a isso”, conta.

Das ruas de Nova Iorque para as montanhas de Utah

Mountainhead
Mountainhead créditos: HBO

Longe do frenesim urbano de Nova Iorque, o elenco encontrou um cenário bem diferente durante a rodagem do filme, que os levou até uma montanha isolada em Utah, nos Estados Unidos. "Adoro estar num lugar um pouco mais calmo ou isolado durante as filmagens, porque assim dá para se concentrar mesmo no trabalho e, acho que, como elenco, conseguimos conhecer-nos melhor, e isso ajudou muito", destaca Ramy Youssef. 

"Acho que o isolamento ajudou a expor o comportamento infantil destes quatro homens que têm de estar num ambiente onde estão apenas com as suas emoções e podem sentar-se e falar sobre o seu património líquido ou a sua tecnologia o quanto quiserem. Mas, no final das contas, são apenas quatro homens que não têm ideia de como lidar com o que sentem. Acho que é por isso que o filme se torna tão caótico. Por isso, o isolamento foi ótimo para mim”, acrescenta.

Já Cory Michael Smith confessa que “adora trabalhar em filmes devido ao tempo”. “Normalmente são bastante curtos. Quando se pode ir para algum lugar e realmente mergulhar num projeto por um período de tempo, é uma forma muito gratificante de trabalhar. Para este projeto, especificamente com este grupo e tendo um elenco tão pequeno, foi realmente o ideal”, sublinha o ator.

"Cheguei a vomitar"

Mountainhead
Mountainhead créditos: HBO

Mas mergulhar num projeto como este também significou enfrentar condições bastante exigentes. Gravar na montanha, com neve, foi particularmente desafiante. "Um dos meus dias favoritos, que passámos juntos, foi quando subimos a montanha Snowbird, em que se nos vê a escalar a montanha, a enterrar o peito e a escrever o nosso património líquido no peito. Mas aquele dia em particular foi um dia muito especial. Quando estávamos na montanha, havia um vento infernal que mandava a neve para a nossa cara, para o nosso peito e para dentro dos nossos fatos de neve, o que era bastante duro. Mas, no final do dia, estávamos a fazer filmagens com um drone. Não estávamos com a cara para a câmara. Eles só precisavam de filmagens longas de nós a celebrar no topo da montanha. Havia toda essa neve a ser soprada para as nossas caras, e estávamos todos a gritar pelas nossas vidas porque era muito doloroso. Virei-me para a esquerda, onde eles estavam todos. Como o Rami e o Steve têm barba, pareciam bonecos de neve gelados”, recorda, entre risos, Cory Michael Smith.

“Sim, estava com muita dificuldade. Cheguei a vomitar (...) Vomitei no hotel”, revela Ramy.

A estreia de Jesse Armstrong como realizador

Apesar dos desafios físicos, a experiência na rodagem foi marcada por uma forte liderança criativa. "Mountainhead” marca a estreia de Jesse Armstrong como realizador. "Foi fantástico. Rodeou-se de produtores executivos com quem tem uma relação de longa data, com quem trabalha há muito tempo e em quem confia. E havia toda uma equipa de especialistas que o apoiava e apoiava o seu esforço criativo. Mas os instintos do Jesse eram sempre muito claros. A sua capacidade de comunicar o que queria e precisava era muito clara. Quero dizer, foi muito fácil, honestamente. E ele é sempre a pessoa mais brilhante na sala. E essa é uma qualidade adorável num realizador”, elogia Cory Michael Smith.

O que vai fazer o criador de
O que vai fazer o criador de

"Confiamos sempre no que ele estava a fazer porque, como disse o Cory, ele parecia estar sempre preparado, sempre a tentar esclarecer as ideias. Acho que é isso que tu sentes no set, queres um realizador que saiba garantir que tudo o que está no guião está realmente a acontecer de forma clara diante da câmara quando filmamos”, acrescenta Ramy Youssef.

A confiança na visão do realizador acabou por ser essencial para dar vida a um projeto que, embora pontuado por momentos de humor, não hesita em mergulhar em temas densos, inquietantes e profundamente atuais. "Mountainhead" propõe uma reflexão sobre o estado do mundo, o impacto da tecnologia e o modo como lidamos — ou escolhemos não lidar — com realidades desconfortáveis. Sob a liderança de Jesse Armstrong, o elenco encontrou espaço para explorar todas camadas com profundidade.

"Há um acesso constante a pessoas no poder"

Mountainhead
Mountainhead créditos: HBO

"Grande parte do trabalho envolveu ver imagens de coisas que estão a acontecer no mundo e ler manchetes de notícias que não parecem muito distantes. E isso foi bastante assustador. Para mim, foi muito familiar a tensão do mundo real que sinto todos os dias ao ver manchetes absolutamente devastadoras e depois andar por uma sociedade que nem sempre lida diretamente com essas manchetes. Todos nós sentimos essa dissonância cognitiva nas nossas vidas, e acho que este projeto, com certeza, colocou essa dissonância em evidência”, diz Ramy Youssef.

Para Cory Michael Smith, “vivemos num momento em que há um acesso constante a pessoas no poder ou exposição a pessoas no poder”: “Há câmaras constantemente a filmá-las. Elas estão frequentemente a falar em público, talvez mais do que deveriam. E é incrivelmente revelador ver como tantas pessoas poderosas são incompetentes. E quando se lida com ferramentas tão poderosas como a IA, isso pode ser alarmante. Por isso, viver num ambiente em que retratamos estas pessoas que têm um poder extraordinário e se comportam desta forma é perturbador", acrescenta.

"Perturbador. E, idealmente, o humor corta mesmo esse bolo perturbador. Bolo perturbador. Uma fatia bem servida para si na HBO”, remata o ator.