
Joaquin Phoenix é o protagonista do sombrio e satírico "Eddington", que estreou no Festival de Cannes na sexta-feira, uma abordagem mordaz das guerras culturais americanas ambientada numa pequena cidade do Novo México.
O filme do realizador norte-americano em ascensão Ari Aster é um 'thriller' perturbador, mas muitas vezes divertido, ao estilo de um western, ambientado na política tóxica e das teorias da conspiração dos EUA.
Phoenix brilha como um xerife profundamente falível que tenta manter a ordem na cidade de Eddington no momento do uso obrigatório de máscaras por causa da COVID-19, protestos divisivos do movimento "Black Lives Matter" e tensões intergeracionais.
"Acho que estamos num momento em que todos vivem numa realidade diferente, na sua própria realidade, e ninguém consegue concordar sobre o que é real e o que está realmente a acontecer", disse Aster a jornalistas em Cannes.
"De certa forma, perdemos uma das forças sociais que sempre esteve no centro das democracias liberais, que é uma versão acordada do que é real."
Questionado se os EUA estavam doentes, o realizador de 38 anos respondeu: "Sim, com certeza."
"Acho que a ligação final com aquele antigo sistema (de concordar sobre o que é real) foi cortado durante a COVID", explicou. "Acho que foi o começo de algo em grande."
Mais conhecido pelos seus anteriores filmes de terror, "Hereditário" e "Midsommar", Aster parece estar a parodiar toda a gente, dos conservadores do sul dos EUA amantes de armas até os ativistas brancos antirracistas que adoram espalhar a virtude.
Emma Stone (a vencedora dos Óscares por "La La Land" e "Pobres Criaturas") interpreta a esposa de Phoenix, que mergulha num mundo de teóricos da conspiração de direita obcecados por pedófilos.
Quebra de confiança

Aster admitiu ter um pressentimento sobre o rumo que os EUA tomariam e decidiu dramatizá-lo no seu filme, cuja sátira social inicial gradualmente dá lugar a ações muito mais sombrias e violentas.
Questionado se a polarização política americana e a quebra de confiança nos media poderiam estar a levar o país ao caminho da violência em massa, disse: "Isso é certamente algo que me preocupa".
"Neste momento, parece que nada está a ser feito para apaziguar a fúria", disse aos jornalistas.
No elenco recheado de estrelas de Aster, que inclui Pedro Pascal e Austin Butler ("Elvis"), as personagens estão constantemente a filmarem-se umas às outras, a publicar nas redes sociais e a trocar mensagens.
Numa cena, Joe Cross (Phoenix) é questionado por um subordinado se deveria partilhar um vídeo online do seu discurso incendiário.
"Não me faças pensar nisso. Coloca!", reage Cross.
O filme é "sobre o que acontece quando as pessoas que discordam sobre a realidade começam a entrar em conflito umas com as outras", explicou Aster. "E é isso que começa a dominar todos."
O filme concorre à prestigiada Palma de Ouro na competição principal em Cannes, que será anunciada a 24 de maio.
O vencedor do ano passado, "Anora", do também realizador norte-americano Sean Baker, viria a triunfar nos Óscares na cerimónia de 2 de março.
"Eddington" tem estreia internacional prevista para julho. A portuguesa ainda não está anunciada.
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