Foi preciso esperar seis anos, mas a Argentina regressou à competição pelo Urso de Ouro no Festival de Berlim com "El Prófugo" [O Fugitivo, em tradução livre], um "thriller" com Érica Rivas e Cecilia Roth.
Apresentado esta sexta-feira (21), o segundo dia da Berlinale, o filme concorre com outros 17 ao maior prémio, que será anunciado dia 29 pelo júri presidido pelo ator britânico Jeremy Irons.
Ironicamente, a realizadora, Natalia Meta, confessou ter tido de superar o seu medo de ver este tipo de filmes.
Ela rodeou-se de um elenco impressionante para a sua segunda longa-metragem, inspirada no romance de terror "El mal menor", do escritor argentino C. E. Feiling.
Com as atrizes principais estão Daniel Hendler (Urso de Prata no festival para Melhor Ator em 2004 por "El abrazo partido") e o prolífico Nahuel Pérez Biscayart, este ano também presente na Berlinale com o filme russo "Persian Lessons" ["Lições Persas", em tradução livre].
Érica Rivas, vista há alguns anos nos cinemas portugueses no nomeado aos Óscares "Relatos Selvagens", surge como Inés, uma profissional de dobragem e membro de um grupo coral que, após uma experiência traumática, sofre pesadelos e alucinações, a ponto de se evaporar a demarcação entre fantasia e realidade. Pouco a pouco, os sons ocupam o seu corpo, forçando a protagonista a procurar uma saída.
Uma tensão permanente marca a passagem do filme de Natalia Meta, que jogo com o sono e a vigília, procurando a coexistência dos dois mundos, sem julgar o bem ou o mal.
"Queria apagar a fronteira do bem e do mal" tão característica dos "thrillers", afirmou a realizadora, acompanhada do elenco principal em Berlim.
"Com as janelas abertas"
Após a sua estreia no policial "Muerte en Buenos Aires" (2014, inédito em Portugal), Meta explicou que decidiu explorar o género de terror após ler o livro do "mítico" Feiling, falecido prematuramente em 1997 por doença.
O seu problema: "Tenho muito medo de filmes de terror. É sério".
"Mas decidi perder o medo e comecei a ver" filmes do género "em casa, durante o dia, com todas as janelas abertas", confessou.
Assim, "Mulholland Drive", de David Lynch, é uma das grandes referências de "El Prófugo", embora Meta volte a mover novamente as fronteiras e incorpore elementos de comédia – protagonizados principalmente pelo insuportável namorado de Inés, Leopoldo (Daniel Hendler) – e de drama.
Outro protagonista do filme: os sons que enlouquecem Inés e desafiam o espectador ao mesmo tempo.
"O som é quase indistinguível [da ação]. Quando batem á porta, no filme, pode ser perfeitamente a da sua casa", afirma Meta.
Apelo ao aborto legal
Já Érica Rivas levou para Berlinale a voz do movimento social que exige, na Argentina, a legalização do aborto.
"Estamos a pedir o aborto legal no nosso país", afirmou, após milhares de mulheres terem ido para as ruas esta semana com lenços verdes a favor da causa.
Na competição pelo Urso de Ouro, "El Prófugo" enfrentará os últimos trabalhos de realizadores como Abel Ferrara, Philippe Garrel, Sally Potter e Kelly Reichardt.
No ano passado, quem levou o Urso de Ouro foi "Sinónimos", de Nadav Lapid.
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