Uma adaptação de "O Estrangeiro" de Albert Camus, dirigida por François Ozon, e um 'thriller' político sobre uma crise nuclear realizado por Kathryn Bigelow são as principais propostas de terça-feira no Festival de Cinema de Veneza.

Para filmar "O Estrangeiro", que relata a mudanç que se dá na vida de um modesto funcionário na Argélia sob a colonização francesa após a morte da sua mãe, Ozon reencontrou os atores Benjamin Voisin e Rebecca Marder, com quem já havia trabalhado respetivamente em "Verão de 85" (2020) e "O Crime É Meu" (2023).

Nesta adaptação bem-sucedida a preto e branco da obra do existencialista francês Albert Camus, Benjamin Voisin interpreta Mersault, um personagem recluso, apático e de poucas palavras. Um registo ao qual Voisin não habituou os espectadores.

"Teria adorado filmar na Argélia, teria gostado de filmar em Argel. Filmámos em Marrocos e correu muito bem, em Tânger", reconheceu, esta terça-feira, numa conferência de imprensa, o cineasta francês, aludindo às "relações complicadas" entre a França e a Argélia.

Para o cineasta, de 57 anos, o seu filme deveria oferecer "uma visão atual sobre esta história", ainda quente, e lamentou que, apesar de haver tantas "famílias francesas com vínculo com esse país" não tenha sido "feito um trabalho histórico suficiente de introspeção".

François Ozon com os atores Rebecca Marder e Benjamin Voisin no festival de Veneza a 2 de setembro de 2025

A outra grande estreia de terça-feira é trazida pela realizadora norte-americana Kathryn Bigelow, que apresenta "A House Of Dynamite" ("Casa de Dinamite" em tradução livre), um 'thriller' político para a Netflix ambientado na Casa Branca e com um míssil lançado por um agressor desconhecido em direção aos EUA.

A cineasta de 73 anos, que realizou o oscarizado "Estado de Guerra", colaborou nesta ocasião com Idris Elba e Rebecca Ferguson.

"Senti que era importante trazer esta conversa", destacou a realizadora na conferência de imprensa.

"Este é um tema global, o das armas nucleares (...): estamos realmente a viver numa casa de dinamite", alertou.

"A House Of Dynamite"

Tanto "O Estrangeiro" como "A House Of Dynamite" fazem parte da seleção de 21 filmes que competem este ano pelo Leão de Ouro, que será atribuído em 6 de setembro por um júri presidido pelo americano Alexander Payne e que inclui a atriz brasileira Fernanda Torres, a atriz chinesa Zhao Tao, o cineasta francês Stéphane Brizé, a cineasta italiana Maura Delpero, o cineasta romeno Cristian Mungiu e o cineasta iraniano Mohammad Rasoulof.

Por outro lado, "Dead Man's Wire", o último filme de Gus Van Sant (73 anos), apresentado na terça-feira na Mostra, não competirá pelo prémio.

O último filme do norte-americano conta a história de Tony Kiritsis, um homem que, sufocado pelas dívidas, tomou como refém o seu credor, diretor de uma empresa de créditos hipotecários.

Dos videoclipes para os filmes

Na secção "Horizontes", dedicada a novas tendências, a surpresa vem das mãos do americano-colombiano Stillz, conhecido por dirigir videoclipes de artistas como Bad Bunny e Rosalía, e que nesta terça-feira apresenta no Lido "Barrio triste", a sua primeira longa-metragem.

Com a estética própria do artista (granulação do filme, cores intensas) e um movimento errático de câmara, Stillz segue um grupo de jovens no final dos anos 1980 num bairro empobrecido de Medellín.

A história começa com o roubo de uma câmara de um jornalista, com a qual os jovens acabam por mostrar um mundo cheio de violência, mas também de solidão e vulnerabilidade, principalmente através do olhar de Juan (interpretado por Juan Pablo Baena), um jovem cansado dessa tristeza, que anseia pela inocência e pelo apoio da sua família.

Também competirá pelo prémio de melhor filme de estreia o espanhol Gabriel Azorín, realizador de "Anoche conquisté Tebas", sobre um grupo de amigos portugueses que visitam as termas romanas e acabam por conhecer os soldados que as construíram há centenas de anos.

Azorín projeta o seu filme na secção paralela "Jornadas dos autores".