
A guerra de Gaza foi a protagonista na quarta-feira do 82.º Festival de Veneza, onde a franco-tunisina Kaouther Ben Hania apresentou "The Voice of Hind Rajab", um filme baseado na história real de uma menina palestiniana morta pelas forças israelitas enquanto tentava fugir da Cidade de Gaza.
"The Voice of Hind Rajab" recria as longas horas vividas a 29 de janeiro de 2024, quando os trabalhadores de um centro de emergência em Ramallah, na Cisjordânia, tentaram salvar a criança de cinco anos, refugiada num carro com seis familiares.
Com o consentimento da sua mãe, foram utilizadas no filme as gravações reais da chamada em que Hind Rajab pedia socorro; registos que causaram grande comoção em todo o mundo quando vieram à tona.
"Fique comigo, não me abandone", ouve-se a menina dizer na chamada, entrecortada pelo som de tiros e bombas.

A projeção oficial terminou com uma ovação de 23 minutos, com vários espectadores a erguer bandeiras palestinianas e a gritar slogans na sala do palácio de festivais, constatou um jornalista da agência France-Presse (AFP).
A equipa do filme, composta por atores palestinianos, acabou a chorar. Duas horas antes, vestidos de preto e levando uma foto de Hind Rajab, os atores e a realizadora desfilaram pela passadeira vermelha, acompanhados pelo casal formado por Rooney Mara e Joaquin Phoenix, produtores executivos, numa rara presença pública em conjunto.
O filme também conta com o apoio de Brad Pitt e dos cineastas Alfonso Cuarón e Jonathan Glazer, também produtores executivos.

Apresentado em seleção oficial, é um dos 21 que competem este ano pelo Leão de Ouro, que será atribuído no sábado por um júri presidido pelo cineasta norte-americano Alexander Payne que inclui a atriz brasileira Fernanda Torres, a atriz chinesa Zhao Tao, o cineasta francês Stéphane Brizé, a cineasta italiana Maura Delpero, o cineasta romeno Cristian Mungiu e o cineasta iraniano Mohammad Rasoulof.
"Desumanizante"
"Estamos a ver que, em todo o mundo, a imprensa apresenta os mortos em Gaza como danos colaterais. Parece-me muito desumanizante, por isso o cinema, a arte e todas as formas de expressão são tão importantes para dar uma voz e um rosto a essas pessoas", afirmou Ben Hania numa conferência de imprensa.
Desde o início do festival, a 27 de agosto, que o glamour do evento foi eclipsado em diversos momentos pela devastadora situação da Faixa de Gaza, palco de uma guerra desencadeada pelo ataque do movimento islamista palestiniano Hamas em Israel a 7 de outubro de 2023.
Um coletivo fundado por dez cineastas italianos independentes, chamado Venice4Palestine (V4P), manifestou-se no início da Mostra condenando a guerra no território palestino, com uma carta aberta, que reuniu - segundo o grupo - duas mil assinaturas.
Também compareceram várias personalidades que expressaram a sua condenação à ofensiva israelita.
A realizadora marroquina Maryam Touzani e o seu marido, o cineasta Nabil Ayouche, seguraram um cartaz preto onde se lia "Stop the genocide in Gaza" ("Parem o genocídio em Gaza") na passadeira vermelha, e a cineasta argentina Lucrecia Martel denunciou que "diariamente vemos imagens e sons de um país a ser devastado, um povo a ser devastado, que é a Palestina".
Por sua vez, o diretor artístico do festival, Alberto Barbera, afirmou que o evento é "um lugar de abertura e debate".
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