Ao lado de Gene Kelly realizou "Serenata à Chuva" e "Um Dia em Nova Iorque" e a solo assinou mais uma série de musicais inesquecíveis como "Sete Noivas para Sete Irmãos", "Cinderela em Paris", e "Negócio de Pijamas".
Stanley Donen, o último dos grandes realizadores sobreviventes da idade de ouro de Hollywood, morreu na quinta-feira, aos 94 anos, de ataque cardíaco. A notícia foi confirmada por um dos seus filhos ao crítico de cinema Michael Phillips, do "Chicago Tribune".
Nascido em 1924, Donen estreou-se logo aos 16 anos em 1940, como dançarino de coro na encenação original da Broadway da peça "Pal Joey", protagonizada por um também jovem Gene Kelly, que se tornaria aí uma estrela, e de quem se tornaria assistente de coreografia. Em 1943, rumaria a Hollywood e assinaria contrato com a MGM, onde começaria por pequenos trabalhos de dança e coreografia até ter a sua primeira oportunidade de brilhar, ao lado de Kelly, num filme que este fez emprestado à Columbia, "Modelos", com o qual coreografou três sequências de dança que deram que falar.
Juntos continuariam a coreografar os filmes que tornariam Kelly uma super-estrela, nomeadamente "Paixão de Marinheiros" e "A Linda Ditadora", até que em 1949 a MGM autorizou finalmente a dupla a assinar um filme enquanto realizadores. O resultado foi um clássico, "Um Dia em Nova Iorque", adaptado da peça da Broadway de Adolph Green e Betty Comden, que revolucionou o musical de Hollywood pela forma como o libertou das constrições do estúdio, numa rodagem feita parcialmente pelas ruas de Nova Iorque.
Após realizar a solo o musical "Casamento Real", com o célebre número de Fred Astaire a dançar pelas paredes, e o drama romântico "O Melhor é Casar", com Elizabeth Taylor, voltou em 1952 a co-assinar um filme com Gene Kelly, que se tornaria o mais mítico de todos o musicais de Hollywood, "Serenata à Chuva", uma visão romântica sobre a transição do cinema mudo para o sonoro, com alguns dos melhores números da história do cinema.
Seguiram-se vários filmes a "solo", como a comédia "Fagan, o Destemido", o "biopic" "Bem no Meu Coração", sobre o compositor Sigmund Romberg, e o ultra-enérgico musical "Sete Noivas para Sete Irmãos", um dos maiores êxitos da sua carreira, antes da última colaboração com Kelly enquanto realizadores, em 1955, "Dançando nas Nuvens", um musical de tonalidades mais sombrias, sobre o reencontro de três camaradas de armas da Segunda Guerra Mundial que não se viam há 10 anos.
Acabado o contrato com a MGM e com o sistema de estúdios a começar a colapsar, Stanley Donen começa a trabalhar como realizador independente, assinando logo em 1957 mais dois musicais que se tornariam clássicos, "Cinderela em Paris", com Fred Astaire e Audrey Hepburn, e "Negócio de Pijamas", com Doris Day.
Ainda nesse ano, realizaria a comédia "Quatro Dias de Loucura", com Cary Grant, com quem fundaria a produtora Grandon Productions, e que o levaria a tornar-se também produtor de praticamente todos os seus filmes daí para a frente. A comédia romântica "Indiscreto", com Grant e Ingrid Bergman, foi o primeiro sucesso da produtora, a que se seguiu o musical "Brincadeiras do Diabo", adaptação da peça "Damn Yankees".
O sucesso na Europa e a queda no regresso a Hollywood
Elogiado pelos críticos europeus mais em voga por via da revista "Cahiers du Cinèma", Donen prosseguiria carreira com uma enorme variedade de filmes, só pontualmente regressando ao musical. Passou a década de 60 em Inglaterra, onde assinou sucessos como a comédia "Ele, Ela e o Marido", com Cary Grant, Deborah Kerr e Robert Mitchum, o thriller "Arabesco", com Gregory Peck e Sophia Loren, o muito elogiado drama "Caminho para Dois", com Audrey Hepburn e Albert Finney, e a sofisticada comédia de espionagem "Charada", um dos maiores sucessos da sua carreira, onde voltaram a brilhar Cary Grant e Audrey Hepburn.
No final da década, assumindo o tom mais irreverente da época, assinou as desvairadas comédias "Bedazzled", com Peter Cook e Dudley Moore, e "Staircase", com Richard Burton e Rex Harrison, uma comédia sobre um casal homossexual estreada... em 1969.
Regressado a Hollywood no início dos anos 70, nunca conseguiria recuperar o brilho de outrora. O sucesso de bilheteira não o acompanhou nos seus filmes seguintes: uma versão musical de "O Principezinho" em 1974, com participações de Bob Fosse e Gene Wilder; uma comédia passada na época da Lei Seca, "Uma Mulher dos Diabos", protagonizada por Gene Hackman, Burt Reynolds e Liza Minnelli; uma homenagem às sessões duplas da era de ouro de Hollywood em "Fitas Loucas"; um filme de ficção científica com Kirk Douglas, "Saturno 3, o Robot Assassino"; e, já em 1984, uma comédia com toques picantes e cenário de bilhete postal, "Romance no Rio", com Michael Caine.
Este último seria o seu filme para cinema, já que para o pequeno ecrã realizaria ainda, em 1999, o telefilme "Love Letters", para além de dois trabalhos mais curtos mas muito mais memoráveis ainda em 1986: uma sequência musical para um episódio da série "Modelo e Detective" e o teledisco da tema "Dancing on the Ceilling", em que colocou Lionel Richie a dançar pelas paredes e pelo teto, como o fizera com Fred Astaire quatro décadas antes.
Em 1998, recebeu das mãos de Martin Scorsese um Óscar honorário de carreira, e que agradeceu com um pequeno número musical, em que cantou "Cheek to Cheek" e fez uns passos de sapateado, no que se tornou um dos momentos mais memoráveis da história das cerimónias da Academia. No seu discurso de agradecimento afirmou que o segredo de realizar filmes de sucesso que era conseguir os melhores atores, argumentistas e compositores, e, quando a produção do filme arrancava "sair da frente do caminho deles".
Numa entrevista à revista Vanity Fair, em 2013, disse: "Ver Fred Astaire num filme mudou a minha vida. Parecia tudo tão maravilhoso, e a minha vida não era maravilhosa. A alegria de dançar ao som da música! E Ginger Rogers!".
Donen foi casado cinco vezes (a primeira das quais com Jeanne Coyne, que depois casaria com Kelly), teve um caso famoso com a atriz Elizabeth Taylor, e vivia desde 1999 com a realizadora e atriz Elaine May.
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