A conversa, decorrida no hotel D. Pedro, em Lisboa, girou em torno da grande obra-prima de Sorrentino, mas também sobre o primeiro filme que ambos fizeram juntos (“L’uomo in Piú”, em 2001) e um dos mais recentes projetos, “A Estranha Comédia da Vida”, que encerrou a parte lisboeta da Festa.
Sempre simpático, riu-se quando questionado sobre se seria um “workaholic” - um boato que insinuava o seu apego louco ao trabalho. “Nada disso, não sou, não, embora a minha mulher provavelmente pense que sim!”, brincou. Depois, em tom mais sério, arrematou: “o que tenho é a grande, imensa sorte de poder divertir-me enquanto trabalho. É um privilégio enorme”.
O início de uma grande aventura
Falando em trabalho, Servillo, na verdade um ator com uma carreira muito mais longa no teatro do que no cinema, apresentou no Maria Matos a peça “A Voz de Dante”, onde declamou versos do famoso poeta medieval.
Na sétima arte, no entanto, a Festa exibiu a primeira colaboração entre o ator e Sorrentino, “L’uomo in Piú”. Nesta obra, Servillo encarna um cantor popular (“sou mesmo eu quem canta no filme!”, diz a rir) caído em desgraça depois de assediar uma jovem de 16 anos.
Para além de lembrar da experiência com grande afeto, foi nesta altura, aliás, que o ator adivinhou a grande promessa que era Sorrentino: “Nesse filme podia-se prever que estava para começar uma grande aventura”, observou.
“A Grande Beleza”, um “presente da vida”
O auge desta aventura chegou em 2013, ano da produção de “A Grande Beleza”, onde Toni Servillo imortalizou o inesquecível Jep Gambardella, um escritor de apenas um livro publicado enquanto jovem e que perambulava por uma Roma melancólica enquanto questionava os seus valores depois de comemorar 65 anos.
A partir daí, o filme transforma-se numa sinfonia de música extraordinária, belíssimas imagens e um doloroso e nostálgico mergulho no retrato de um mundo que lentamente se desvanecia. Na altura, conseguiram imaginar que estavam a fazer um projeto destinado a uma enorme carreira de prémios e de encanto das audiências?”
“Não, jamais. Nunca sequer imaginámos a repercussão que o filme viria a ter! Esse é filme foi um um presente da vida e, depois dele, já nada mais me pode surpreender”, entusiasma-se.
“A Estranha Comédia da Vida”
Já o mais recente filme de Servillo a chegar a Portugal reúne, novamente, teatro e cinema e debruça-se sobre um episódio histórico marcante da história das artes - o dia em que Luig Pirandello, um dos mais notáveis dramaturgos do teatro mundial - apresentou em Roma “Seis Personagens à Procura de um Autor”, em 1922. A peça trazia várias inovações formais e causou um enorme escândalo na sua primeira apresentação.
Conforme observa, o filme é uma reimaginação de grande alcance de Roberto Andó que seria pensar em como Pirandello chegou à ideia para a peça - entrando aqui numa via bastante imaginativa: o famoso dramaturgo dirige-se à sua terra natal, a Sicília, e conhece o trabalho amador no teatro dos dois coveiros da localidade. Vêm daí algumas das ideias fundamentais que seriam utilizadas por Pirandello e que influenciaria imensamente a história do teatro - a relação do processo criativo com as audiências.
Os coveiros “encenadores” são interpretados por dois cómicos famosos em Itália e, numa altura pós-pandémica, Servillo celebra os grandes números de bilheteira que o filme alcançou no seu país. “As pessoas foram atraídas pela ideia de ver juntos dois dos atores cómicos mais conhecidos com um ator associado a seriedade do cinema de autor”, acredita.
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