Videoclip de "Plague":

"(III)" será, então, o disco "sério" dos Crystal Castles? É, pelo menos, bastante mais denso do que aquilo que nos mostraram até aqui, cortando com alguns dos momentos mais lúdicos, espevitados ou explosivos que lhes deram fama - e proveito, acrescente-se, em dois álbuns que estão entre a produção eletrónica mais criativa dos últimos anos. É também um disco mais coeso, fluído, com uma clara identidade de álbum (o facto de ser o mais curto até agora ajuda), a contrastar com a dispersão e rara versatilidade dos antecessores. Também por isso, é ligeiramente menos surpreendente, sobretudo ao primeiro impacto, sem tantas faixas que se destaquem de forma tão evidente como algumas dos anteriores, mas convencendo - e presenteando audições repetidas - pela solidez do conjunto.

O resultado de "(III)", com uma sugestão de maturidade a suceder à excitação de "Crystal Castles" (2008) e... "Crystal Castles" (2010), não equivale, felizmente (e ao contrário da evolução de tantas outras bandas), a acomodação ou reciclagem de ideias. Pelo contrário, a exploração do som, das texturas e dos seus limites mantém-se na mira da dupla sem grandes cedências: ouça-se a voz de Alice Glass, quase sempre distorcida (para não dizer triturada, esventrada ou violada) e aqui mais esbatida do que nunca, tal como boa parte da teia instrumental.

Nos momentos mais extremos, a vocalista soa como se a ouvíssemos, a partir de um sotão, a cantar aprisionada no fundo de uma cave, com uma atitude bipolar que vai da postura mais visceral (caso do acesso noise de "Insulin") a uma pureza que dá à obra dos Crystal Castles alguns dos seus momentos mais envolventes (a fragilidade etérea "Child, I Will Hurt You", a fechar o disco, não destoaria no reputado catálogo dream pop da 4AD). Este contraste de ambientes, sem ser novidade nos discos do duo, parece-nos aqui menos impulsivo, com uma combinação mais depurada entre a voz e os instrumentos, finalmente uma simbiose e não um choque de elementos distintos.

Agora mais atenta à melodia do que ao ritmo, a linguagem dos Crystal Castles aperfeiçoa-se e renova-se sem destruir pontes com episódios anteriores: a potência de "Wrath of God" é sucessora de "Baptism" e deverá ter efeito equiparável ao vivo (ou seja, o mosh promete continuar a ser regra nos concertos), a mais tranquilizante "Affection" é prima direita de "Celestica" (não atinge a perfeição desta, mas quase) e "Telepath", instrumental circular, faria uma dupla imbatível com "Intimate" numa pista de dança imaginária.
Mais inesperada, "Sad Eyes" é outra com enorme potencial ao vivo, sendo também o mais próximo do trance(!) que os Crystal Castles já estiveram e uma valente lição de pujança às estrelas EDM do momento (a face mais visível e menos inventiva da eletrónica dançável).
"Violent Youth" e sobretudo "Kerosene" adensam o contato com territórios 8-bit, percorridos pela dupla desde os primeiros tempos, e "Mercenary", apesar de curta, é a faixa mais grandiosa do disco, com uma melodia arrebatadora logo aos primeiros minutos que quase acaba afogada em distorção. Essa passagem sintetiza bem a relação entre harmonia e tensão que os Crystal Castles continuam a defender como poucos, já que não há muitas bandas recentes que possam orgulhar-se de uma discografia tão impressionante. Discutir se "(III)" é melhor ou pior do que os anteriores nem é importante quando o disco continua a dar-nos tantos motivos para regressarmos às suas canções, outra e outra vez. Neste caso, a (brilhante) capa não engana...

@Gonçalo Sá