Nascido de um desafio lançado pelo coletivo Bestiário ao desenhador de luz Manuel Abrantes, “Lumina” mostra o resultado de um caminho diferente para o processo artístico.

“O espetáculo está construído de uma forma muito pragmática, ou seja, temos centenas de deixas de luz, cronometradas com tempos próprios, em que não são os atores que mandam”, explicou aos jornalistas Miguel Ponte, que divide a direção artística do espetáculo com Manuel Abrantes.

Segundo o encenador, normalmente, “a luz espera pelos atores para ser dada a deixa e entrar”, mas em “Lumina” os atores “estão a toque de caixa: ou eles respondem ou não respondem, se não respondem ficam para trás”.

Em 2019, o Bestiário já tinha convidado Manuel Abrantes a criar um desenho de luz para o espetáculo “Umbra”, que explora a sombra (partindo dos conceitos de silêncio, lentidão e escuridão), e concluíram que “tinha havido uma simbiose e um trabalho em conjunto muito interessante”.

“Um bocadinho aliado à vontade de repensar ‘Umbra’ e voltar a repô-la em cena, começámos a pensar: e se fizéssemos um espetáculo oposto, um espetáculo sobre a luz?”, recordou Miguel Ponte.

Manuel Abrantes explicou aos jornalistas que, por norma, o trabalho do desenhador de luz acontece quando já existe “uma base bruta do que vai ser o objeto artístico final”.

“Aqui não, aqui a proposta foi por a luz e depois os atores. Ao início, da minha parte, havia o receio de ser um espetáculo de efeitos de luz. Mas o espetáculo ficou homogéneo, é claramente um jogo em que os atores têm de alinhar”, frisou.

Miguel Ponte avançou que, em maio, será possível ver “Umbra” e “Lumina” no mesmo dia, no Centro Cultural de Belém, que é coprodutor deste espetáculo juntamente com O Espaço do Tempo e o Teatro Viriato.

“É uma dor de cabeça logística e para os atores é um estoiro, mas queremos todos muito que aconteça, porque faz todo o sentido”, considerou.

“Lumina” conta com a interpretação de Teresa Vaz, Joana Petiz, Afonso Viriato e Helena Caldeira, a única que não entrou em “Umbra”.

O espetáculo apresenta uma reflexão sobre o “excesso do contemporâneo”, e segundo Miguel Ponte, o objetivo é que a linha dramatúrgica, ainda que inconscientemente, deixe a sensação no público de “partir de um excesso, de um abuso de imagens, de velocidade e de ruído”.

“Está tudo lá metido no 'pote' e nós vamos limpando. Vamos limpando e vamos criando uma coisa mais humana, mas como é Lumina é transumana, humana digital”, acrescentou.