O espetáculo é apresentado em estreia nacional na programação do Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica (FITEI) pelas 19h45 de sexta-feira, sábado e domingo, depois de já ter sido feito em Buenos Aires, Santa Fe e Rafaela, na Argentina.
Desta feita, são 10 jovens da Academia Contemporânea do Espetáculo (ACE) a explorar o jardim com a equipa, no caso Ana Melo, Ana Teixeira, Bruna Silva, Filipa Pinto, Luana Silva, Luísa Tedim, Margarida Reis, Marta Yü Belo, Melissa Lima e Rita Almeida.
O público será, assim, conduzido por um espaço que contém várias secções, da Árvore de Ler à Casa dos Peluches, a Piscina Espelho e até uma cena nova criada em específico para o espaço no Porto, e será também convidado a ocupar o espaço em conjunto com as jovens.
“Em Buenos Aires, dirijo um espaço, um teatro [Zelaya], com um jardim muito bonito, como este em que fazemos cá, e comecei a pensar numa obra para esse espaço, que tinha elementos de fantástico, de mágico, e uni essa variável à vontade de trabalhar com a adolescência”, contou Agostina Luz López, em entrevista à Lusa à margem da residência artística que tem feito por estes dias no Porto.
Desde 2020, e do impacto da pandemia de COVID-19, que procurou olhar para a adolescência como um “estado de vulnerabilidade, entre ser adulto e criança, e de transição, que também gera disponibilidade”, criando esta “ficção em que as adolescentes deixam as suas famílias e vão viver naquele jardim”.
Esse ato de rebeldia com que muitos adolescentes sonham durante aqueles anos, em pegar na mochila e fugir, inventar uma nova vida, é aqui fabulado num grupo de amigas que decide inventar novas regras de convivência naquele jardim.
O trabalho de Angela Carter, por exemplo, influencia esta ocupação, como o mito de Narciso e outras obras literárias e filosóficas, mantendo o tom cénico num lugar “de auto-observação, reflexivo, próprio daquela idade”.
“Quem sou, quem vou ser, quem fui... é o deixar para trás a infância, com este estado de melancolia de passagem do tempo. A obra termina, depois, derivando para um lugar de fusão com este jardim”, disse a criadora.
Autora do texto e diretora de cena, Luz López encontrou na Natureza uma possível fusão com a humanidade, que “tem a ver com um habitar mais selvagem”, próprio da forma como, na adolescência, se ocupa um lugar e se interage com outros corpos, mas também “como se algo da Humanidade também se despojasse” e entregasse.
“É possível relacionar estes adolescentes e a urgência climática, que não está diretamente na obra, mas ressoa. Os adolescentes de hoje são os que vão viver esse futuro cada vez mais hostil. Há algo muito idealista, também, próprio da idade, de querer mudar o mundo. Essa consciência é muito concreta”, acrescentou.
Entre diferenças e semelhanças entre jovens argentinas e portuguesas, salta esse “ocupar selvagem, a profundidade e dramaticidade própria da adolescência”, e uma similitude nos contextos socioeconómicos, onde a criadora admite que podiam sentir-se diferenças maiores.
“O que é interessante neste projeto é o que trazem as pessoas, o que trazem os espaços. Surpreendeu-me este jardim que o FITEI encontrou. É muito perfeito para a obra. Tinha os vários pontos necessários, e aqui há um espaço como se fosse um labirinto, a que chamamos com as miúdas o ‘labirinto dos sonhos’. Invento uma cena nova porque o espaço me pede”, agregou Agostina Luz López.
A escritora lembrou ainda como esta “experiência imersiva”, por entre um mundo mais feminino, depois de dois rapazes da oficina original em Buenos Aires não terem conseguido seguir no projeto, “convida o público para uma experiência que se corporiza” com a proximidade.
“Acabei a montar este mundo mais feminino, destas raparigas. Em Buenos Aires, foi muito forte o movimento feminista, com as marchas do 08 de março e dos direitos da mulher. Estão a passar um momento muito complexo, depois de uns anos muito excitantes, pelas conversas que se tiveram e direitos conquistados, [em contraponto com] este crescimento da extrema-direita, mas também a crise económica”, completa.
Agostina Luz López trabalha como escritora e encenadora, tendo criado e apresentado já cinco espetáculos e recebido o Prémio Florêncio Sánchez e o Prémio S, além de publicar também literatura, começando pelo romance “Weiwei” (2017) e “Outro planeta” (2021).
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