
Fanny Ardant defendeu a lenda do cinema Gérard Depardieu, que está a ser julgado em Paris por duas alegadas agressões sexuais durante a rodagem de um filme em 2021, afirmando que nunca viu nenhum gesto "escandaloso".
O ator de 76 anos, que fez mais de 200 filmes e séries de televisão, é a figura de maior destaque a enfrentar acusações de violência sexual na resposta do cinema francês ao #MeToo, um movimento que ele descreveu como um "terror".
O julgamento concentra-se nas acusações de Amélie, uma cenógrafa 54 anos, e Sarah (pseudónimo), uma assistente de realização de 34 anos, de agressão e assédio sexual, além de insultos sexistas, durante a rodagem de "Les Volets Verts", de Jean Becker.
"Eu, Fanny Ardant, nunca presenciei um gesto que considerasse escandaloso", declarou a atriz na quarta-feira, no terceiro dia do julgamento no Tribunal Correcional, descrevendo o ator como um "amigo de longa data".
"Também sou mulher, já passei por coisas assim. Sei que se pode dizer não a Gérard", acrescentou Ardant, que alcançou fama internacional na década de 1980 com "A Mulher do Lado", de François Truffaut, ao lado do ator.

Nas alegações finais esta quinta-feira de manhã, o Ministério Público pediu uma pena suspensa de 18 meses de prisão e uma multa de 20 mil euros para o ator.
Além da multa e indemnização às autoras do processo, foi solicitado que se este se submeta a tratamento psicológico e seja inscrito no registo de autores de crimes sexuais.
O visado não reagiu ao pedido, mas, minutos antes, disse perante uma câmara da agência France-Presse que estava "cansado".
"Durante três anos fui arrastado na lama por mentiras e calúnias que corroem o meu sangue e o meu desejo de comunicar com pessoas de todas as idades", afirmou o acusado, vestido de preto, nas suas últimas palavras perante o tribunal.
Já a advogada de uma das queixosas disse que "durante quatro dias, não testemunhámos uma estratégia de defesa, mas sim à apologia do sexismo”.
"'Prostituta', 'idiota', 'gorda', 'fazer com que te venhas', 'Sou um homem a sério, tenho o direito'", citou Claude Vincent no início das suas alegações perante uma audiência atónita, segundo a agência France-Presse.
“Todas estas palavras (...) Este é Gérard Depardieu num set, este é o ambiente que ele impõe”, acrescentou a advogada de Sarah.
“Não é nem Jean Valjean nem Cyrano de Bergerac, nem os homens que interpretou. Ele é Gérard Depardieu e é um misógino!”, disse.
Os advogados também aproveitaram a oportunidade para denunciar os múltiplos ataques que eles e as suas clientes receberam durante o julgamento.
“Mentirosa, histérica, vai chorar!”, gritou por exemplo o advogado do ator, Jérémie Assous, às duas queixosas.
O advogado acrescentou que elas são contadoras de histórias ao serviço de uma "organização" de "feministas raivosas" que se beneficiam da "publicidade [do meio de investigação] Mediapart com a cumplicidade do Ministério Público".
"Não lhe toquei!"
Sarah, a queixosa de 34 anos, afirma que, a 1 de setembro de 2021, o ator colocou "a mão nas [suas] nádegas", entre outras agressões, uma versão que manteve na quarta-feira.
"Nessa noite a sua equipa não estava lá. Saímos do camarim, estava escuro e, no fim do caminho, ele tranquilamente colocou a mão nas minhas nádegas", descreveu aos juízes.
A mulher explicou que o ator a agrediu duas vezes, tocando as suas nádegas e seios. Nas duas vezes, "eu disse não!", exclamou.
Em sua defesa, o premiado ator de filmes como "Cyrano de Bergerac" afirmou que nunca fica sozinho nas rodagens pois está acompanhado da sua equipe: figurinista, caracterizador e segurança.
"Talvez tenha esbarrado nela com as costas no corredor, mas não lhe toquei!", disse o réu de 76 anos, vestido de preto, negando novamente qualquer agressão sexual durante a rodagem.
"Não cometi agressão sexual; agressão é mais grave do que isso, acredito eu", disse o ator, que se defendera no dia anterior das acusações da primeira queixosa, Amélie.
"Mais grave do que o quê?", perguntou a advogada de Sarah, Claude Vincent. "Mais grave do que uma mão nas nádegas. Bem, não toquei nas nádegas", respondeu Depardieu.
Num primeiro momento, a assistente de realização não disse nada sobre o ocorrido até desabafar com o seu superior, que exigiu da produção um pedido de desculpas do ator.
Ele desculpou-se "muito contrariado", lembrou Sarah. Então, transformou a sua vida num inferno, chamou-a de "bufa" e "maluca" além de se recusar a trabalhar com ela, diz.
"Não queria que jovens se aproximassem do camarim porque sou grosseiro!", alegou o ator.
"Disse: 'Vamos deixar as pessoas que se escandalizam por nada. Prefiro que seja um homem'", acrescentou.
"Sou vulgar, sou grosseiro, sou desbocado", mas "não toco", acrescentou o acusado.
O veredito será anunciado a 13 de maio, anunciou o tribunal.
Além do julgamento, vinte mulheres acusaram-no de comportamento semelhante, mas a maioria das queixas foi rejeitada porque o prazo já prescreveu.
A atriz francesa Charlotte Arnould foi a primeira a registar uma queixa. Em agosto, o Ministério Público de Paris solicitou que o ator fosse julgado por violações e agressões sexuais.
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