Em dia de Camões, uma epopeia sem igual. Atores, fogo, robô e o explosivo jogo de luzes elevaram os fãs dos Muse a outra dimensão, ao futuro. Eles bem tinham prometido que seria o “melhor espectáculo de rock do planeta”. Mas, não foi só do planeta, foi da galáxia. Por mais ou menos três horas a Terra viveu um novo Big Bang.
20h00. A música ambiente é desligada. Surge nos ecrãs gigantes uma mensagem dos Muse: “Estamos contentes por mostrar este vídeo de Animals feito por portugueses”. E logo as 45 mil pessoas que estavam no Dragão, gritaram a uma só voz. Era um adagio do que estava para chegar.
Logo depois, o aquecimento para o jogo dos Muse com os We Are The Ocean que trouxeram do Reino Unido o seu hardcore/ punk. Durante o pouco tempo de actuação dos britânicos, o público aproveitou para jantar, depois de horas de espera. Outros, ouviam o jogo da selecção. Tudo calmo, o público só queria Muse.
Mas, entre ondas e ao som de Alt-J ou LCD Soundsystem, no Dragão foi-se treinando ovações para Matthew Bellamy e companhia. Foram longos minutos de espera, que deram tempo para declarações de amor nos camarotes e jogos de cartas no relvado.
De repente, um súbito apagar de luzes. Os gritos fazem a Torre das Antas, ali ao lado, estremecer. Ouvem-se os primeiros acordes de “Supremacy”. Em cima do palco, uma espécie de chaminés, que fazem lembrar os balões de S. João, que soltam a chama do Dragão. Ouve-se um “Boa Noite Porto”, com uma explosão de fogo no meio campo. Eram os Muse, envolvidos num cenário de ficção cientifica.
“Panic Station”, depois de "Supermassive Black Hole”, trouxe Obama a dançar. Mas foi quando apareceu Cristiano Ronaldo, a dar uns toques na bola, que o público delirou. Depois, os ecrãs foram ocupados com danças de Angela Merkel, Hollande e Putin. Aí os assobios foram gerais. Mas, no meio desta gente toda, não podia faltar um Sapo de fato e gravata, como manda a etiqueta, a tocar saxofone.
Entretanto, volta-se a ouvir "Animals" no palco. E a critica social continua. Nos ecrãs vão passando os valores da cotação da bolsa. Entre as luzes vermelhas e verdes, aparece um actor, que atira notas de “20 Muse” para o público. E assim vai o actor, ao estilo de Hitchcock, rasgando dinheiro até à plataforma montada no centro do estádio, onde cai no chão morto e desaparece.
No fundo, ouve-se uma harmónica. Podia ser uma música do Rui Veloso, mas não. É o início de “Knights Of Cydonia”, que faz o público "arrebentar" (como diz um bom tripeiro) de emoção.
No meio do espetáculo hollywoodesco, alguém atira a bandeira de Portugal, que Christopher Wolstenholme coloca ao ombro. Ao mesmo tempo, e, como não podia faltar, Matthew Bellamy apanha um cachecol do Futebol Clube do Porto e coloca-o ao pescoço, para compensar as calças vermelhas que vestia.
E foi uma, “Hysteria”, quando soaram as primeiras notas de “Feeling Good”. No meio da mega-produção de luzes, aparece uma mulher numa secretária, vestida a rigor - podia mesmo ser a assistente de Pinto da Costa. Sem ninguém o fazer prever, começa a correr para o cento do palco, onde agarra uma mangueira de um posto de gasolina e começa a beber até ser sugada pela plataforma montada no centro das emoções.
E, de música em música, os Muse foram navegando pelos grandes sucessos. Primeiro "Follow Me". Logo depois,"Madness", onde cada salto estava sincronizado com gigantescas explosões de fogo, em que cada uma das pessoas sentia um súbito calor na pele.
No alinhamento seguiu-se "Time Is Running Out" (com "House of the Rising Sun", dos Animals, a servir de intro) e “New Born”, escolhida por uma roleta que girava nos monumentais ecrãs, que eram a essência de todo o cenário cinematográfico. E estava fechada, com chave de ouro, a primeira parte do concerto.
Os níveis de euforia no sangue do público estavam acima do permitido por lei. Para que ninguém fosse multado, os Muse subiram ao centro do relvado e deram pontapé de saída para um momento de fazer inveja à procissão de velas em Fátima. Logo nos primeiros segundos de “Unintended”, as luzes dos telemóveis tiraram todo o protagonismo à estrutura de holofotes do palco e, a uma só voz, as 45 mil pessoas cantaram religiosamente.
Seguiu-se no menu “Guiding Light” e, a provar o delírio entre a multidão, “Undisclosed Desires”, que fez Matthew Bellamy saltar para bem junto do público. E, ao contrário de outros concertos, o vocalista distribuiu apertos de mãos, beijinhos e, com a bandeira de Portugal às costas, aproveitou para roubar uns óculos floreados deixando o estádio a gargalhar. Teve ainda tempo para se ajoelhar perante os caixões com o actor e a actriz que morreram em palco, mostrando mais uma vez o lado sarcástico.
E a viagem pelo mundo futurista continuava. Eis que surge um robô de 5 metros de altura, ao som de “The 2nd Law: Unsustainable", que nos faz pensar se o amanhã será assim.
O concerto caminhava para o fim. Mas em cada música, uma nova experiência do outro mundo. “Plug In Baby”, fez que o público cantasse numa só voz, e “Survival”, (música ofical dos Jogos Olímpicos de Londres), acendeu mais uma vez a chama da alucinação total. Foi 2001 e 2012 em confronto, foram dois universos diferentes no mesmo palco, com a mesma banda.
E mais um adeus. E mais um encore. Depois de um instrumental, “Uprising”, com toda a banda vestida de vermelho (os portistas não se chatearam) a serem multiplicados sem fim nos ecrãs do palco - é caso para dizer, eram mais que as mães.
E, apesar do cartaz que pedia para Matthew Bellamy não partir a guitarra, o vocalista atirou-a três vezes com toda a força, até ficar me pedaços, entre a escuridão que desceu ao Dragão.
Escuridão que fazia adivinhar o fim. Mas ainda faltava um dos singles com mais sucesso de sempre: "Starlight", que fez explodir a chama de todos e de cada um. E assim foi o fim da viagem espacial pelo universo dos Muse e o regresso à Terra. Mas, enquanto há Muse, há esperança.
Fotografias@Filipa Oliveira
Comentários