Petbrick é o nome do projeto que junta Iggor Cavalera (Sepultura/ Soulwax/ Mixhell) e Wayne Adams (Big Lad/ Death Pedals). O duo estreia-se em Portugal em janeiro, em duas datas: dia 16 no Maus Hábitos, no Porto, e dia 17 no Musicbox, em Lisboa. A passagem dos músicos por terras lusitanas também trará o "I", disco de estreia lançado em outubro deste ano pela Rocket Recording.
O SAPO Mag esteve à conversa com Wayne Adams sobre as suas influências pessoais, a parceria com Iggor Cavalera e de como funcionou o processo de criação do álbum.
O músico frisou ainda de questões políticas atuais que envolvem censura e autoritarismo. "É incrivelmente triste que tenhamos de lutar, mas infelizmente parece mesmo ser o caminho a ser tomado", afirmou.
SAPO MAG: Gostaria de saber como foram os seus primeiros contactos com a música e quando ocorreu a transição para sons mais pesados. Houve algum álbum em específico que tenha mudado a sua vida?
Wayne Adams: É bom estar aqui! Uma das primeiras lembranças que tenho, em relação à música, é de mim deitado no chão do corredor da minha casa com uns seis ou sete anos de idade e um 'toca-fitas portátil' que eu tinha. O meu pai deu-me uma cópia dos Black Sabbath - Black Sabbath em cassete, e eu ficava a ouvir aquilo! Falava para a minha irmã mais nova que ela não podia escutar porque era muito assustador. Outra coisa estranha é que eu tinha também o LP 'Bad' do Michael Jackson. Só que eu o colocava a tocar em 45 rotações por minuto ao invés vez das 33 RPM, pois achava que soava bem melhor assim. Isso explica muito. Mas, quanto a álbuns que mudaram a minha vida, há tantos que nem dá para citar.
Iggor, o seu parceiro nos Petbrick, é reconhecido como um dos bateristas mais inventivos do metal. As viradas e a maneira como ele intercala as batidas nos riffs são absolutamente peculiares. Como tem sido tocar com ele e o que acha que ele acrescenta de diferente a este projeto musical?
Como disseste, o jeito que ele toca bateria é completamente único, então, obviamente, apenas por estar no projeto, o 'espírito musical' dele está por toda parte. Mas, ele também traz muito à mesa os 'noises' e os sintetizadores. O riff de sintetizador em 'Horse', que abre o nosso novo álbum, é dele. Portanto, tocar com alguém que tem trazido tanta inovação à música pesada ao longo dos anos será sempre um prazer.
Como funciona o processo de criação musical entre vocês? Vocês trocam algumas ideias primeiro sobre como querem que uma faixa soe ou simplesmente tocam juntos, mantendo nas estruturas dos sons o que acham melhor?
Na verdade, este não é um projeto que vem da reprodução ao vivo, isso é algo posterior. Este trabalho é mais de estúdio, composto diretamente num computador. Trabalhamos os arranjos entre os instrumentos e o computador... E, assim que ficamos contentes com o resultado, descobrimos juntos o que fazer para as performances ao vivo.
Vê a música apenas como um entretenimento ou acha que ela tem um papel mais especial? O Brasil está a enfrentar uma fase muito difícil, também na comunidade artística. Como vê a ascensão de governos autoritários em todo o mundo, ainda mais os que planeiam censurar e proibir atuações de artistas de cunho mais subversivo?
Acho que serve para ambos os papéis, porém no mainstream acredito que a música seja consumida mais como mero entretenimento pela maioria das pessoas. Só que os artistas usam táticas subversivas para transmitirem ideias, pensamentos e sentimentos em um nível bastante subconsciente. No Reino Unido, algumas das maiores estrelas do pop são ativas politicamente. Stormzy, por exemplo, tem sido muito incisivo ao apoiar a ala da esquerda, e sua atuação em Glastonbury também foi politicamente muito carregada. No que diz respeito ao underground, já vejo isso mais como algo que funciona de ambas as formas. Este público é muito mais consciente e corrobora bem a mensagem dos artistas. Com relação à ascensão da extrema direita e da tentativa de proibir e censurar a arte, acho que essa é uma luta absolutamente essencial. É incrivelmente triste que tenhamos de lutar, mas infelizmente parece mesmo ser o caminho a ser tomado.
Como vê a cena eletrónica / industrial hoje em dia?
Eu tento não pensar muito sobre isso, apenas continuo com o que faço e tento fazer da melhor maneira. Mas há, definitivamente, um renascimento refrescante de sons industriais atualmente.
As ferramentas de produção musical têm sido bastante sofisticadas, eficazes e rápidas ultimamente. Com o desenvolvimento da computação quântica, como imagina a evolução da música nas próximas décadas? Acredita que a parte orgânica / humana ainda será de suma importância ou as máquinas vão tomar conta de tudo um dia?
Acho que de facto muita música será produzida dessa maneira. Infelizmente, também imagino que isso afetará o sustento por parte dos músicos. Digo, mais no sentido da música feita para a TV, talvez um pouco menos em filmes. Só que a biblioteca de músicas provavelmente irá tornar-se numa coisa do passado, porque poderás simplesmente 'dar um tapa' no que queres e esse tipo de computador vai gerar um trecho da música. Assim como ocorreu com a resiliência do vinil, acredito que a composição musical humana será transferida para o underground, para aqueles que adoram tocar. Sabemos que a música é uma via de mão dupla. Portanto, enquanto as pessoas ainda quiserem fazer som ao vivo, a composição humana nunca desaparecerá.
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