
O realizador João Rosas, para quem o cinema é "um lugar de encontros", estreia esta semana o filme “A Vida Luminosa” que é parte de uma tetralogia sobre crescimento e formação de identidade.
“A Vida Luminosa” é a primeira longa-metragem de ficção de João Rosas e relaciona-se diretamente com três curtas-metragens que fez entre 2012 e 2020 - “Entrecampos”, “Maria do Mar” e “Catavento” –, unidas por vários pontos em comum, narrativos, geográficos e de elenco.
A longa-metragem é centrada em Nicolau (o ator Francisco Melo), um jovem de Lisboa a dar os primeiros passos na vida adulta, dividido entre trabalhos temporários e o desejo de ser músico, ao mesmo tempo que ressaca de um desgosto de amor e acompanha a separação dos pais.
“O que me interessava neste filme ['A Vida Luminosa’] era a formação da identidade, quando começamos a seguir o nosso próprio caminho, saímos de casa dos pais, começamos a trabalhar, deixamos de ser apenas filhos. O filme está construído em torno desse dilema”, explicou João Rosas em entrevista à agência Lusa.

Embora tenha uma narrativa e identidade autónomas, “A Vida Luminosa” é uma continuidade de "Entrecampos”, “Maria do Mar” e “Catavento”, ao registar de forma cronológica várias etapas de crescimento da personagem Nicolau, da infância à idade adulta.
João Rosas disse que, quando fez “Entrecampos” (2012), não tinha uma ideia planeada para uma tetralogia. Queria filmar o espaço urbano de Lisboa, torná-lo uma personagem que interagisse com os atores.
“Queria deixar a cidade falar. Queria trabalhar a dimensão poética da minha memória da cidade, mas sem, com isso, produzir um discurso memorial ou nostálgico. Sempre ancorado no presente e no realismo e viver a cidade no seu quotidiano”, contou.
Mas como para João Rosas “o cinema tem muito a ver com essa ideia de relação com certas pessoas e com certos lugares”, os projetos cinematográficos acabaram por envolver amigos e atores com quem fez amizade.
Depois de "Entrecampos", Nicolau tornou-se o motor dos filmes seguintes, ao lado de uma galeria de personagens comuns, como a amiga Mariana (Francisca Alarcão) e o irmão Simão (Miguel Carmo), e com a tetralogia a ter um arco temporal de mais de uma década.

João Rosas nasceu em Lisboa, em 1981, e formou-se em Ciências da Comunicação, já com a intenção de seguir Cinema, que estudou em Londres.
Publicou contos na adolescência, nomeadamente “Qualquer Pessoa Dá Um Homicida Qualquer” e “Deus Morreu e eu Não Fui ao Funeral”, e os primeiros filmes realizados foram a curta-metragem “A Minha Mãe É Pianista” (2005) e o documentário “Birth of a City” (2009).
Entre as curtas-metragens e este novo filme “A Vida Luminosa”, João Rosas fez o documentário “A Morte de Uma Cidade” (2022), no qual aborda a transformação imobiliária em Lisboa, com o turismo e a gentrificação.
“Quando comecei a ver cinema com mais atenção, foi isso que me fascinou: o cinema como forma de olhar o mundo, que é uma coisa que ainda me interessa muito, mais do que a linguagem e os aspetos formais. (…) Parto sempre para o filme a partir deste questionamento por algo que me intriga, que quero tentar perceber, partilhar este processo de descoberta, e o cinema é o meio para levar a cabo essa descoberta, tanto na ficção como no documentário”, afirmou.
João Rosas, que citou várias vezes o cinema de Nanni Moretti como uma referência na sátira e na ironia, também tem uma participação como ator em “A Vida Luminosa”, no papel de um realizador a quem alguém diz que tem medo do talento e que o desperdiça a fazer cinema.
“É uma variação cómica de mim, da ideia que as pessoas têm dos realizadores, de alguém atormentado e a lamentar-se da sua triste sorte”, contou.

Sobre “A Vida Luminosa”, João Rosas não sabe se haverá mais filmes protagonizados por Nicolau.
“Não sei se fecha alguma coisa. Tenho ideias de novas cenas em que o coloco noutras fases da vida”, disse, acrescentando: “Sei que o próximo filme que vou fazer não é com o Nicolau. É sobre um realizador que não quer fazer um filme. Vamos lá ver se vou querer fazê-lo. Ainda está numa fase muito embrionária.”
João Rosas gostaria que os quatro filmes fossem vistos de forma cronológica, mas tudo dependerá dos programadores e exibidores.
“O filme ['A Vida Luminosa'] funciona sem as 'curtas'. O trabalho com o tempo está no meu gesto cinematográfico. No facto de ser uma tetralogia, o tempo tem um caráter fundamental nessa relação seja com o Francisco Melo [o ator de Nicolau] seja com a cidade”, disse.
“A Vida Luminosa”, com produção da Midas Filmes, teve estreia mundial em maio, no Festival IndieLisboa, chega às salas de cinema na quinta-feira e estará em competição em julho no festival de Karlovy Vary, na República Checa.
TRAILER.
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