“Estou muito curioso para perceber a reação do público, não tenho noção que diálogo pode despontar. Uma das razões que me leva a ficar contente por ser selecionado para San Sebastián é ser o festival espanhol mais importante, e acontecer no país basco, que foi sempre um bastião de resistência ao regime franquista”, afirmou Pedro Peralta à agência Lusa.
“Noite Perpétua” recria a situação ocorrida em 1939, em Castuera, Espanha, onde Matilde Morillo Sanchez, mulher de um republicano, foi abordada em casa por dois guardas para ‘dar um passeio’. Percebendo que iria ser executada, a mulher pede para amamentar a filha recém-nascida antes de sair.
Matilde Morillo Sanchez existiu na realidade e o corpo nunca foi encontrado, sendo uma das milhares de vítimas da repressão durante a ditadura de Franco, em Espanha.
É aquela situação doméstica e familiar, antes da mulher ser levada pela polícia, que Pedro Peralta recria em 17 minutos de um filme “formalmente rigoroso na planificação da ‘mise-en-scène’”, e com a participação de não atores.
“Interessa-me profundamente esta situação limite de uma pessoa que se vê confrontada com a iminência da morte. Ela responde com amor, com a dignidade dela face a uma profunda injustiça. Esta questão toca em algo fundamental para mim: Se a morte é inevitável, que vida viver?”, afirmou Pedro Peralta.
“Noite perpétua” terá estreia na quarta-feira, em San Sebastián, numa altura em que o governo espanhol acaba de apresentar o projeto de “Lei da Memória Democrática” para reparar e reconhecer definitivamente as vítimas do franquismo e acabar com a exaltação da antiga ditadura.
“A questão da recuperação da memória histórica tem sido um processo lento, cínico e dissimulado. Espanha é um país profundamente dividido”, recorda Pedro Peralta, e é por isso que diz estar curioso em saber como será o filme recebido em Espanha.
O projeto de lei espanhol foi uma das promessas eleitorais do primeiro-ministro, Pedro Sánchez, e tem por base a Lei da Memória Histórica aprovada em 2007, que os familiares das vítimas da Guerra Civil de 1936-39 e da ditadura franquista, que se lhe seguiu, consideram ser insuficiente.
Um dos aspetos mais controversos e contestados pelos saudosistas do regime anterior é a proibição prevista para as organizações que fazem a apologia do franquismo e que atualmente beneficiam de dinheiros públicos ou reduções fiscais, como a Fundação Francisco Franco.
O projeto de Lei da Memória Democrática inicia agora o processo de aprovação parlamentar, que deverá demorar vários meses até ser, eventualmente, aprovado.
Mais de 500.000 pessoas morreram na guerra entre as forças nacionalistas rebeldes lideradas por Francisco Franco e os defensores de uma república espanhola de curta duração.
Franco declarou vitória a 1 de Abril de 1939, e governou com punho de ferro até à sua morte em 1975.
“Noite Perpétua” está integrado na secção competitiva Zabaltegi-Tabakalera, do festival, na qual estão também os filmes “Simon Chama”, primeira longa-metragem de Marta Sousa Ribeiro, e “A metamorfose dos pássaros”, de Catarina Vasconcelos, que chega a San Sebastian com um rasto de prémios noutros festivais.
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