A caminho dos
Óscares 2025
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Os Óscares acontecem já na noite deste domingo e com vários pontos de interrogação: a temporada de prémios não elegeu um favorito que seja fortemente consensual, como aconteceu em anos recentes.
Com 13 nomeações, "Emília Pérez" lidera a corrida este ano, seguido por "O Brutalista" e "Wicked" com dez, "Conclave" e "A Complete Unknown" com oito, "Anora" com seis, "Dune - Duna: Parte 2" e "A Substância" com 5.
Destaque incontornável para o brasileiro "Ainda Estou Aqui", nomeado em três importantes categorias: Melhor Filme, Atriz (Fernanda Torres) e Filme Internacional.
O SAPO preparou uma cobertura especial com uma série de conteúdos de antevisão e com acompanhamento ao minuto pela noite dentro, atualização de todos os vencedores e análise dos principais acontecimentos, da passadeira vermelha até à cerimónia. Tudo isto, numa área especial dedicada ao tema no SAPO Mag e em www.sapo.pt.
O que se sabe da grande noite de Hollywood?
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A cerimónia dos Óscares é o Super Bowl de Hollywood: começa quando for meia-noite em Lisboa e a transmissão será na RTP1 com a apresentação de Mário Augusto e, pela primeira vez vez, na plataforma Disney+.
Em Los Angeles, será praticamente a meio da tarde: as estrelas estarão sentadas no Dolby Theatre às 16h00 e a pré-emissão com a passadeira vermelha apresentada por Julianne Hough e Jesse Palmer volta a ter apenas meia-hora (15h30).
A Academia e o canal ABC mantêm assim o horário de 2024, uma decisão assumidamente para continuar a recuperar audiências, evitando que os vencedores das categorias mais importantes sejam conhecidos na costa leste dos EUA já perto da meia-noite: no ano passado, impulsionado pelo fenómeno "Barbenheimer", a cerimónia chegou aos 19,5 milhões de espectadores no país, um valor muito bom na atual fragmentação dos media (os Grammys ficaram pelos 15,4 milhões a 2 de fevereiro) e uma grande recuperação dos baixos valores históricos durante a pandemia à volta dos 10 milhões, que levaram alguns a questionar se a cerimónia ainda era relevante na era do TikTok.
Após Jimmy Kimmel recusar regressar pela quinta vez, Conan O’Brien será o anfitrião: trata-se de uma das vozes mais originais, inventivas e estimulante da comédia dos EUA desde o final da década de 1980, primeiro como argumentista em "Saturday Night Live" e "Os Simpsons", e a seguir como apresentador do "late-night" e, mais recentemente, como uma das estrelas dos novos media com o sucesso do podcast "Conan O'Brien Needs a Friend" (desde 2018), também com muitos fãs internacionais.
Incrivelmente, fará a sua estreia nos Óscares aos 61 anos, no mais recente capítulo da longa relação da Academia com os apresentadores do "late-night", que começou com Johnny Carson (cinco vezes anfitrião entre 1979 e 1984) e continuou com David Letterman (1995), Jon Stewart (2006 e 2008) e Jimmy Kimmel (quatro vezes entre 2017 e 2024).
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Prometidos estão segmentos pré-gravados, que fizeram parte das suas elogiosas prestações como anfitrião nos Emmys em 2002 e 2006, e nos MTV Movie Awards em 2014. Conan O’Brien é um 'insider' da indústria que facilmente se relacionará com uma audiência de estrelas nervosas, além de ter uma grande experiência numa função sujeita a cada vez maior pressão das reações imediatas nas redes sociais, que tornaram estes programas polarizadores e pouco atrativos para os comediantes.
Efetivamente, a imprensa especializada revelou que, além de Kimmel, a Academia também terá ouvido um "não" de John Mulaney, um dos comediantes mais populares da uma geração mais jovem, que conquistou a exigente comunidade de Hollywood no ano passado com a prestação na cerimónia dos Governors Awards (os Óscares honorários).
Também se terá pensado na dupla Ryan Reynolds/Hugh Jackman, protagonista de "Deadpool & Wolverine", mas o primeiro disse que era algo que 'adoraria fazer um dia' com o amigo, mas não logo a seguir a ter saído da extenuante campanha de promoção do grande sucesso de bilheteira do verão (as declarações foram um mês e meio antes de ser envolvido no processo judicial da esposa Blake Lively e de Justin Baldoni, o ator e realizador de "Isto Acaba Aqui", um escândalo que os responsáveis da Academia certamente dispensariam caso tivessem contratado a dupla).
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Após ganharem um Emmy pelo seu trabalho na cerimónia do ano passado (juntamente com Kimmel e a sua esposa, a produtora Molly McNearney), o primeiro para os Óscares desde 1991, Raj Kapoor e Katy Mullan regressam como produtores e reconhecem que o seu planeamento de meses teve de ser alterado após os devastadores incêndios de janeiro que tanto impacto tiveram em Los Angeles.
Apesar dos apelos, incluindo do escritor Stephen King e da atriz Jean Smart, "nunca houve um debate sobre cancelar ou adiar a cerimónia”, disse Raj Kapoor numa antecipação ao The Wrap sobre o que esperar da grande noite de Hollywood.
E acrescentou: “Enquanto produtores e para a Academia, foi uma mensagem de apoio muito importante para a cidade que a cerimónia prosseguisse. Empregamos milhares de pessoas – somos um evento responsável por… uma parte do rendimento anual das pessoas. Muitas pessoas trabalham nesta cerimónia e dependem de nós.”
O produtor, que também trabalhou na cerimónia reformulada dos Grammys a 2 de fevereiro, disse noutra entrevista de antecipação ao Deadline que "ao longo da noite, haverá alguns marcos para serem reconhecidos porque muitas pessoas naquela sala e na indústria foram impactadas por isto, e acho que quase toda a gente em Los Angeles conhece alguém que sofreu algum tipo de perda ou impacto".
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O tema dos Óscares será, anuncia a dupla, a "ligação" entre as pessoas: “O que nos inspira no cinema é a alquimia que existe por detrás – tantas pessoas incríveis a unirem-se para criar uma obra-prima", disseram à revista Variety.
“Este programa faz parte de algo contínuo. Estamos a honrar o passado, a refletir o presente e a inspirar o futuro do cinema”, explicaram.
Não se espere é que a cerimónia só dure três horas: Academia, canal ABC e produtores tentam e falham esse objetivo... desde 1978, o ano da vitória de "Annie Hall", de Woody Allen (cuja ausência poupou o tempo do discurso de Melhor Realização).
Katy Mullan está resignada e promete outra meta: "Queremos sempre fazê-lo em três horas e meia. São três horas e meia. Sentimos sempre a pressão de torná-la a cerimónia mais rápida e divertida, e garantir que cumprimos a hora para que... todos possam ir dormir se estiverem na Costa Leste.” [com uma diferença horária de três horas]
Sacrificadas foram as apresentações dos nomeados para Melhor Canção Original: um dia antes da revelação das nomeações, a Academia anunciou que os seus compositores serão homenageados através de 'reflexões pessoais' dos bastidores das equipas criativas, o que gerou consternação, com apelos infrutíferos para que fosse revertida a decisão 'extremamente desrespeitosa', como se queixou Diane Warren, nomeada pela 16.ª vez e que ainda não ganhou em competição (não são poucos os que acham que seria um situação impensável se estivessem nomeadas 'What Was I Made For?' e 'I'm Just Ken', de "Barbie", em vez de 'El Mal', a canção favorita a ganhar de "Emília Pérez").
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“Quando se olha para tudo o que acontece na cerimónia e o facto de termos de entregar 23 prémios, não há muitas opções para pensamento criativo", defendeu-se Raj Kapoor à revista The Hollywood Reporter.
E reforçou: “Foi uma decisão consciente tomada com a Academia ao dizer que não vamos necessariamente ter as canções originais este ano – que queremos encontrar uma forma diferente de honrar essa categoria. Teríamos ficado extremamente limitados se tivéssemos que fazer todas as cinco canções originais.”
Mas haverá música, desde logo nas homenagens a Los Angeles e ao seu papel na indústria: esta semana, foi anunciado que o prestigiado coro dos Los Angeles Master Chorale e ainda Doja Cat, LISA, Queen Latifah e RAYE irão 'participar em apresentações espetaculares que celebram a comunidade cinematográfica e algumas das suas lendas'.
Uma das lendas foi identificada: à Entertainment Weekly, o diretor musical Michael Bearden revelou uma homenagem especial "com a diversão e a alegria que ele sempre trouxe para a música” ao produtor Quincy Jones, que faleceu em novembro, duas semanas antes de receber um Óscar honorário nos Governors Awards . Posteriormente, Raj Kapoor confirmou que será a atuação de Queen Latifah.
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Previsivelmente, outro grande momento serão as também confirmadas participações de Ariana Grande e Cynthia Erivo: espera-se que a dupla de "Wicked" faça um 'medley' de algumas das canções do musical da Broadway. Raj Kapoor não quis confirmar o rumor de que vão abrir a cerimónia, mas lá deixou escapar que "toda a gente vai assumir que vão atuar juntas e, se isso acontecer, será apenas nos Óscares, porque na verdade não as vimos a cantar juntas desde o lançamento do filme, e que adorável que seria isso acontecer numa cerimónia como a nossa”.
Outra 'apresentação espetacular' será, revelou a Variety, um tributo especial às icónicas canções da saga James Bond, como uma homenagem aos produtores Barbara Brocccoli e Michael G. Wilson, que receberam Óscares honorários em novembro e anunciaram na semana passada que iam passar o controlo criativo à Amazon. Não se sabe se o momento irá focar-se numa canção premiada (foram só três) ou nomeada (outras três) ou algo mais amplo relacionado com as 26 que existem, mas fontes disseram à revista que irá juntar "o que está a ser descrito como um conjunto surpreendente e enorme de talentos".
No ano passado e pela primeira vez desde 2009, as categorias de interpretação foram apresentadas por cinco antigos premiados nas respetivas categorias com alguma ligação com os nomeados: foram momentos muito elogiados e Raj Kapoor diz que isso vai acontecer agora em duas categorias técnicas, mas não em Melhor Realização, como chegou a circular, onde têm planeado algo "realmente especial".
Nas apresentações das nomeações dos atores, regressam os excertos dos seus filmes, ausentes nos últimos anos: como explicou o produtor, "uma coisa com a qual fomos abençoados este ano é uma ampla gama de [filmes] nomeados. Só nos atores, 13 são pela primeira vez. Essa energia, essa perspectiva fresca, é emocionante”.
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Nas duplas de apresentadores, os produtores prometem reencontros de atores que trabalharam e não víamos juntos há algum tempo, além de momentos que podem ser "inesperados e até comoventes", e a possível participação especial de grandes comediantes ao longo da cerimónia.
Além do quarteto de atores que ganhou no ano passado formado por Cillian Murphy e Robert Downey Jr. ("Oppenheimer"), Emma Stone ("Pobres Criaturas") e Da’Vine Joy Randolph ("Os Excluídos") e sem excluir as surpresas que sempre existem, a lista de apresentadores oficial inclui Joe Alwyn, Ana De Armas, Dave Bautista, Halle Berry, Sterling K. Brown, Penélope Cruz, Willem Dafoe, Lily-Rose Depp, Elle Fanning, Harrison Ford, Gal Gadot, Andrew Garfield, Whoopi Goldberg, Selena Gomez, Goldie Hawn, Samuel L. Jackson, Scarlett Johansson, John Lithgow, Connie Nielsen, Amy Poehler, Margaret Qualley, Alba Rohrwacher, Zoe Saldaña, June Squibb, Ben Stiller, Bowen Yang, Oprah Winfrey e Rachel Zegler.
O que se pode esperar dos prémios?
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Cumprindo-se a intenção dos produtores, por volta das três e meia de manhã em Lisboa já se saberá se, afinal, era fácil prever o palmarés da 97.ª edição dos Óscares: basta "Anora" ser eleito o Melhor Filme e ainda receber as estatuetas de Melhor Realização e Argumento Original, um trio de estatuetas para Sean Baker que, se juntar a Montagem, conseguirá igualar o feito de ganhar mais Óscares numa só noite de Walt Disney em 1954 (e que foi por filmes diferentes).
Numa temporada excecionalmente em aberto durante semanas, o vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes sobre uma jovem stripper nova-iorquina que se casa com o filho de um multimilionário russo num romance turbulento e condenado começou por ser desvalorizado após sair sem prémios dos Globos de Ouro a 5 de janeiro, entregues por jornalistas e críticos, antes de afirmar o estatuto de favorito de forma espetacular com uma dupla vitória a 9 de fevereiro nos prémios mais importantes dentro da indústria, os dos Sindicatos dos Realizadores (Directors Guild of America Awards, DGA na sigla inglesa) e Produtores americanos (PGA).
Os DGA estão entre os melhores indicadores: 19 dos últimos 22 vencedores dos DGA ganharam a estatueta dourada de Melhor Realização e ao todo, em 76 anos, apenas oito não conseguiram acumular. E os PGA também coincidiram com o Melhor Filme da academia 16 vezes nos últimos 21 anos e as organizações têm o mesmo sistema de voto preferencial: os votantes ordenam os títulos por ordem de preferência no boletim e os menos votados em primeiro lugar vão sendo eliminados e esses boletins transferidos para os filmes que estão a seguir na lista, num processo de eliminação que se repete sucessivamente até que um tenha mais de 50% dos votos, formando um "consenso".
"Anora" também conquistou o prémio do Sindicato dos Argumentistas (WGA) e, para quem gosta de estatísticas, o único filme a conquistar os prémios dos três sindicatos sem ganhar o Óscar principal foi "O Segredo de Brokeback Mountain" (2005). Soma-se também a recente vitória nos Independent Spirit Awards e, embora não façam parte da indústria, nos Critics' Choice Awards.
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Só que, dizem muitas análises esta semana, trata-se de um favoritismo frágil: "Anora" não se tornou consensual e categórico ao longo da temporada de prémios como os recentes premiados "Tudo em Todo o Lado ao Mesmo Tempo" e "Oppenheimer". Aliás, antes de 9 de fevereiro, outros cinco filmes no grupo de dez também pareciam ter hipóteses válidas de ganhar: "O Brutalista", "A Complete Unknown", "Conclave", "Emília Pérez" e "Wicked" (de fora têm ficado "Ainda Estou Aqui", "Dune - Duna: Parte Dois", "Nickel Boys" e "A Substância").
Agora, só "Conclave", parece ter hipóteses de estragar a festa de "Anora", que foi o que aconteceu noutros dois importantes e recentes eventos da indústria: o 'thriller' sobre os bastidores no Vaticano da eleição de um novo Papa, de que poucos não gostaram e que parece aproximar na vida real, venceu o prémio de Melhor Elenco nos SAG (Sindicato dos Atores) e triunfou nos BAFTA da Academia Britânica (centenas dos seus membros também fazem parte dos 9,945 da Academia com direito a voto). Uma dupla de prémios que valeu a vitória de "A Paixão de Shakespeare" sobre o favorito "O Resgate do Soldado Ryan" na cerimónia de 1999.
Por estes dias, circulam na imprensa especializada os relatos de conversas informais com membros da Academia e vários boletins anónimos de votantes: "Conclave" parece estar forte junto dos mais velhos e profissionais das categorias técnicas, enquanto "Anora" é muito popular junto dos americanos mais jovens e no ramo dos atores, o maior da instituição.
No ano passado, várias vitórias inesperadas em categorias técnicas de "Pobres Criaturas" foram indícios da surpreendente vitória de Emma Stone. No domingo, as pistas para o possível desfecho da noite passam por saber quem vence Montagem ("Anora" e "Conclave" estão nomeados, tal como "O Brutalista" e "Emília Pérez"), Realização (Sean Baker é o favorito, mas há muita admiração pelo trabalho de Brady Corbet em "O Brutalista") e se "Anora" confirma o favoritismo em Argumento Original e "Conclave" em Argumento Secundário. Se algum deles falhar, significa que o respetivo filme não tem tanto apoio como se pensava.
Brasil sonha com o Óscar em ambiente de "Copa do Mundo"
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O Brasil sonha com a estatueta dourada no maior evento de cinema do mundo desde que Fernanda Torres ganhou um histórico Globo de Ouro de Melhor Atriz em Drama, que deu uma visibilidade a "Ainda Estou Aqui" que levou às nomeações a 23 de janeiro não só para Melhor Filme Internacional, mas também Melhor Atriz e, outro feito histórico, Melhor Filme.
O ambiente tem sido de "Copa do Mundo", com uma ruidosa claque de apoio na Internet. Desde a estreia no Brasil em novembro, mais de cinco milhões de espectadores viram o filme nas salas e a 2 de março, o país vai praticamente parar para ver a cerimónia... à maneira brasileira, pois também é o dia dos desfiles do Carnaval e vão estar disponíveis ecrãs gigantes para que as pessoas possam acompanhar o que se passa em Hollywood.
Sinal do que pode estar prestes a chegar um momento histórico para o cinema brasileiro, a cerimónia vai passar na plataforma de streaming Max e também em sinal aberto na Globo, o que não acontecia desde 2022, que lhe vai dar a primazia: quem quiser ver o Carnaval do Rio espera pelo diferido logo a seguir ou passa para a plataforma Globoplay (a exceção é o Rio de Janeiro, onde a emissão ficará no desfile das escolas de samba cariocas e passará para Los Angeles nos momentos mais importantes).
Além dos relatos de que o impacto emocional da história da perda e procura da justiça da família Paiva durante a ditadura militar (1964-1985) transcendeu as fronteiras do Brasil e os múltiplos sinais de a grande paixão por "Ainda Estou Aqui" não é só nas redes sociais, existem ainda as narrativas paralelas na temporada dos prémios à volta da última vez que o país esteve representado em Melhor Filme Internacional (então Filme Estrangeiro) com "Central do Brasil" em 1998, também de Walter Salles.
A protagonista era, claro, Fernanda Montenegro, nomeada para Melhor Atriz, uma proeza inédita para um artista brasileiro (em qualquer categoria de interpretação)... repetida agora pela filha Fernanda Torres num filme onde ambas interpretam a mesma personagem. E claro, os fãs não se cansam de dizer que chegou a altura de reparar a injustiça 'histórica' da derrota da primeira há 26 anos para Gwyneth Paltrow por "A Paixão de Shakespeare".
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Durante a temporada, "Ainda Estou Aqui" não esteve representado nos DGA, PGA ou SAG, e perdeu a competição de Melhor Filme Internacional (ou Estrangeiro) sempre para "Emília Pérez" nos Globos de Ouro, Critics' Choice Awards e BAFTA. Mas analistas e fãs acreditam que isso também é o reflexo de só ter começado a ser mais visto após as nomeações para os Óscares (e na Inglaterra, onde a distribuidora não foi a Sony Classics, como nos EUA, o impacto só chegou com a recente estreia de sucesso nos cinemas).
Daí que se diga que a produção brasileira não foi verdadeiramente testada nos prémios americanos depois dos Globos e não se consegue saber quantos votantes dos Óscares só o descobriram após aparecer em Melhor Filme e qual o impacto que teve numa Academia com um núcleo internacional de 20% dos votantes cada vez mais influente nas nomeações e vitórias. Tudo isto contribui para que "Ainda Estou Aqui" seja um 'dark horse', mas a Variety, Hollywood Reporter e Entertainment Weekly inclinaram-se para a vitória em Melhor Filme Internacional nas suas previsões finais esta semana (e se isso acontecer, mais nervosismo na categoria de Melhor Atriz).
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A esperança brasileira foi reforçada por outro fenómeno incrível: a estratégia da Netflix para "Emília Pérez", a grande favorita após fazer história com as suas 13 nomeações — um recorde para um filme não falado em inglês —, caiu com estrondo com a polémica causada pelas mensagens ofensivas publicadas nas redes sociais pela sua protagonista, a espanhola Karla Sofía Gascón, que piorou a situação com entrevistas e justificações que foram duramente criticadas. O estúdio teve de removê-la da campanha e da temporada e a primeira mulher transgénero nomeada para Melhor Atriz remeteu-se ao silêncio para não prejudicar ainda mais o seu filme (mas estará no Dolby Theatre).
Por tudo isto é legítimo que brasileiros e muitos analistas sintam que o Óscar de Melhor Filme Internacional nunca esteve tão perto de ser conquistado, após o que todos consideram ter sido a maior e mais profissional campanha de promoção de sempre de uma produção nacional em Los Angeles: a equipa tem estado numa autêntica ponte aérea desde a antestreia mundial no Festival de Veneza, onde o filme ganhou o prémio do argumento, desdobrando-se num esforço titânico por entrevistas e eventos para levá-lo a mais pessoas.
Muito tem passado por Fernanda Torres, o rosto da lutadora Eunice Paiva, a saltar entre o seu país e os EUA, com fugas para Lisboa, onde recebeu a notícia das nomeações. Para ela, nada voltará a ser igual: passou de 683 mil seguidores no Instagram no início de junho do ano passado para os atuais 4,38 milhões. Só naquele decisivo mês de janeiro, adicionou 2,12 milhões.
E as outras previsões "And the Oscar goes to..."
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Este ano, nenhum filme se aproximará das sete estatuetas conquistadas por "Oppenheimer" no ano passado. De facto, espera-se que o palmarés seja bem dividido e nenhum filme ultrapasse as três ou quatro. E o vencedor do Óscar de Melhor Filme pode nem ser o que tem mais.
Com 10 nomeações, "O Brutalista, épico sobre um arquiteto que emigra para os EUA após sobreviver ao Holocausto, é o favorito para ganhar Melhor Fotografia, Banda Sonora e, muito provavelmente, Ator, um segundo Óscar para Adrien Brody, que se tornou, aos 29 anos, o mais jovem vencedor de sempre na categoria com "O Pianista" na cerimónia de 2003.
A maior ameaça parece vir de Timothée Chalamet por "A Complete Unknown", que o venceu nos prémios do sindicato dos atores e e bateria o seu recorde por alguns meses. Fez uma campanha cheia de alegria e entusiasmo, mas pouco tradicional, e parece ser a melhor hipótese de vitória nas oito nomeações que recebeu o 'biopic' sobre os primeiros anos de carreira de Bob Dylan. No entanto, Adrien Brody continua a ser o grande favorito numa categoria onde surgem ainda Colman Domingo ("Sing Sing"), Ralph Fiennes ("Conclave") e Sebastian Stan ("The Apprentice – A História de Trump").
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Com cinco nomeações, "A Substância" deve ganhar a estatueta para Melhor Caracterização e Demi Moore também continua a ser a favorita para Melhor Atriz. Marcada por um brilhante discurso nos Globos de Ouro, a sua campanha assente na narrativa do 'regresso' e de ter sido desvalorizada como uma 'atriz pipoca' tem sido irresistível na temporada e são muitos os relatos de apoio dentro da indústria, só não convencendo os votantes dos BAFTA, que preferiram Mikey Madison ("Anora"), deixando pistas sobre a categoria estar muito mais em disputa do que se julgava. Vários analistas acreditam que a corrida é a três por causa de Fernanda Torres e há quem não desvalorize Cynthia Erivo por "Wicked". Só Karla Sofía Gascón parece excluída deste debate por culpa própria.
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Melhor Ator Secundário parece estar definido há muito tempo: Kieran Culkin ganhou tudo ao longo da temporada pela interpretação em "A Verdadeira Dor" de um turista emocional e carismático que regressa às raízes ancestrais na Polónia com o primo neurótico e incompatível (Jesse Eisenberg, também realizador e argumentista). Seria uma grande reviravolta se fosse mencionado qualquer outro dos nomeados: Edward Norton ("A Complete Unknown"), Guy Pearce ("O Brutalista), Jeremy Strong ("The Apprentice") ou Yura Borisov ("Anora").
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Zoë Saldaña também ganhou tudo e parece ter sobrevivido ao escândalo que afetou o seu filme: é a grande favorita para Melhor Atriz Secundária por "Emília Pérez" pelo papel de uma advogada contratada para ajudar um chefe de cartel mexicano a fazer a transição de género. O narcomusical também deverá ganhar Melhor Canção com "El Mal" e eventualmente Filme Internacional, mas ninguém acredita já que vá mais longe, ao contrário do que se chegou a prever após receber as 13 nomeações.
Ainda se falou durante algum tempo de Ariana Grande, mas a temporada deixou-a na mesma posição de Felicity Jones ("O Brutalista"), Isabella Rossellini ("Conclave") e Monica Barbaro ("A Complete Unknown")... todas com hipóteses ínfimas de surpreenderem. Para "Wicked", com dez nomeações, as vitórias mais prováveis são em Guarda-Roupa e Direção Artística.
Com oito nomeações, "Conclave" é o grande favorito em Argumento Adaptado e as previsões apontam que possa juntar a Montagem. E a equipa de "Anora" pode preparar-se para más notícias se Ralph Fiennes for chamado ao palco (ele praticamente não fez campanha, mas um dos melhores atores dos últimos 30 anos não ter um Óscar também é uma narrativa poderosa para influenciar os votantes).
Das cinco nomeações, "Dune - Duna: Parte 2" deverá ficar pela vitória nos Efeitos Visuais, depois de a "Parte 1" ter conquistado seis estatuetas na cerimónia de 2022.
Entre os dez nomeados para Melhor Filme, "Nickel Boys" provavelmente não terá direito a nada, a não ser que surpreenda na outra categoria onde concorre, a de Argumento Adaptado. E, claro, "Ainda Estou Aqui", com três nomeações, também pode ficar sem nada... ou tornar-se ainda mais histórico.
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Em Melhor Longa-Metragem de Animação, será interessante ver se "Robot Selvagem", que teve um orçamento de 78 milhões de dólares, confirma o favoritismo ou surpreende o fenómeno que é "Flow - À Deriva", uma animação sem diálogos da Letónia que custou 3,6 milhões sobre animais a unir-se para sobreviver a um misterioso dilúvio também nomeada em Filme Internacional.
Para Melhor Documentário em Longa-Metragem, as apostas dividem-se entre "Porcelain War", que acompanha artistas ucranianos enquanto defendem a sua arte e o eu país após a invasão da Rússia, e "No Other Land", uma co-produção entre a Palestina e a Noruega de coletivo de quatro ativistas israelitas e palestinianos, que mostram a destruição de Masafer Yatta, na Cisjordânia ocupada, e um ato de resistência criativa na procura de justiça para o conflito.
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