Elisabete Paiva, diretora artística da Materiais Diversos, associação com sede em Minde (Santarém), que assinala 20 anos em atividade, disse à agência Lusa que a programação deste ano vem aprofundar a “prática de tornar visível o movimento de relações, de construção de parcerias, de encontros, de convívio”, desenvolvida na programação regular ao longo de cada biénio que separa os festivais.
“De facto, nos últimos 20 anos a Materiais Diversos tem mantido o tónus da sua missão, e os nossos dois grandes eixos de trabalho são o apoiar a criação e investigação artísticas, através do apoio à produção de espetáculos na área da dança e a sua posterior circulação a nível nacional e internacional, e também a aproximação dos diferentes públicos (…) às artes, nomeadamente à dança”, num “trabalho continuado” e a que o FMD vem “dar corpo”.
Segundo Elisabete Paiva, ao longo do ano são desenvolvidas “inúmeras atividades, algumas mais formativas, outras mais de programação, como é o caso do Festival Materiais Diversos, que surge em 2009 para dar corpo a este eixo e permitir na zona do Médio Tejo a passagem de espetáculos com qualidade idênticas a qualquer teatro e espaço cultural em Lisboa, Porto ou mesmo fora do país”.
A programação é marcada pelo território onde o festival acontece, na Serra d’Aire e Candeeiros e no Polje de Mira-Minde, inspirada pelos “movimentos subtis” das montanhas, das rochas, da água, e com algumas atividades sobre a natureza e os rios, no Centro de Ciência Viva do Alviela.
"Nesta edição, além de procurar tornar visível aquilo que porventura será invisível a maior parte do tempo para a restante comunidade de colegas [o trabalho feito pela Materiais Diversos nos últimos anos], queremos também tornar visível este movimento de desaceleração que vimos experimentando de forma mais decisiva desde 2020", afirmou.
Elisabete Paiva salientou o facto de o programa não ter, "propositadamente", uma hierarquia entre atividades principais e complementares, entre artistas profissionais e não profissionais, e de permitir "a qualquer tipo de público, mediante os seus interesses, navegar com alguma calma, com algum tempo, em roteiros diários ou de vários dias", tendo a experiência da programação, mas também a de "estar no lugar com as pessoas que tornam possível ou inspiram" o festival.
O FMD arranca no dia 5 de outubro, feriado municipal em Alcanena, com a criação de um “ponto de encontro” no meio da Praça da República, onde, com as coletividades e associações, se vai falar do festival, degustar iguarias locais, brindar e dançar.
“Decadência”, de Cátia Terrinca/UMCOLETIVO, a partir do texto homónimo de Judith Teixeira, num trabalho de redescoberta de escritoras portuguesas do século XX, tem estreia marcada para esse dia, às 19h30.
“Mais uma vez, mas este ano com maior profundidade, o Festival Materiais Diversos valoriza o trabalho desenvolvido junto de artistas com os quais estabelece relações de continuidade”, lê-se na nota de imprensa de divulgação do festival.
Além do trabalho de Cátia Terrinca, que apresentará, ainda, “Mil e Uma Noites”, a partir de mulheres do concelho de Alcanena com produção literária, será mostrada a coprodução “KdeiraZ”, de Natália Mendonça, “espetáculo para crianças que traduz um investimento continuado na aproximação de jovens públicos à dança, nomeadamente através de oficinas e residências artísticas”.
No âmbito do apoio a artistas do distrito de Santarém, através da bolsa “Fios do Meio”, será apresentada a antestreia de “Didascálias”, de Giovanna Monteiro e Leonor Mendes, e, no âmbito da bolsa “Novos Materiais”, a criação “La Burla”, de Bibi Dória e Bruno Brandolino.
A partir do espetáculo “Coreografia”, projeto associado da Materiais Diversos em 2020-2022, João dos Santos Martins levará às escolas “Coreografia em sala de aula”.
Da colaboração com o Agrupamento de Escolas de Alcanena na programação regular que a Materiais Diversos desenvolve neste território, será mostrada uma exposição de materiais desenvolvidos nas oficinas “Corpo Comum”, orientadas por Marta Tomé e Raquel Senhorinho, com as turmas de 5.º e 7.º ano.
A programação inclui, ainda, a performance-instalação “Las Lámparas”, de Letícia Scrycky, em que som e luz são usados para procurar “ativar um estado primordial de observação como aquele que se sente quando se contempla o fogo”.
“All in the air is bird”, de María Jerez e Élan d’Orphium, “uma aproximação ao universo sonoro dos pássaros”, que “aprofunda uma pesquisa em práticas de colaboração entre elementos humanos e não humanos”, e “O Banquete das Saudades”, de Anne Lise Le Gac, que “propõe uma experiência partilhada através de sabores e receitas que falam de saudades”, são propostas que “incitam ao desaceleramento, desafiam a perceção e a memória”.
Na ligação a “outros territórios”, o FMD apresentará “Boca Fala Tropa”, de Gio Lourenço, colocando “à vista trânsitos entre Angola e Portugal”, e “a besta, as luas”, uma performance de Elisabete Francisca, que, “através de gestos e sons, enuncia uma representação possível da geografia política de um corpo não submisso”.
Na música, o FMD traz, dia 8 de outubro, Bernardo Branco, com “Cantar de Ouvido”, álbum de música popular e urbana que será lançado em breve, e chica, com “as sonoridades do folk, anti-folk e jazz em parelha com o elemento principal da sua música – o diálogo” a encerrar o festival a 15 de outubro.
Além do “ponto de encontro”, que estará na Praça da República de 5 a 7 de outubro e no Cineteatro São Pedro de 10 a 14, voltam as “mesas longas”, com atores e parceiros locais a discutirem temas como “o papel das comunidades de aprendizagem na educação, a conservação dos rios e ecossistemas ribeirinhos, o futuro dos jovens ou o papel das instituições culturais”.
O programa deste ano inclui um seminário sobre “Companheirismo e colaboração – práticas artísticas para a sustentabilidade”, orientado por Carolina Cifras, Simone Frangi e Clara Antunes, e diversas outras iniciativas.
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